Pokémon AeS Scale World
Eu também esperava que a Panini finalmente lançasse os mangás de Diamond & Pearl, e já estamos no volume 2 (demoraram apenas 8 anos, mas por sorte eu sou paciente).
Eu havia dito também que queria comprar alguns booster da última coleção de TCG Sword & Shield. Fiz umas trocas de cartas de Pokémon no UP!ABC, onde troquei duas cartas de antigas por 700 reais numa loja (foi uma das negociações mais loucas que já fiz).
E por fim, eu cumpri meu maior objetivo que era comprar as coleções Scale World de Pokémon baseadas em Sinnoh. Eu sou apaixonado por miniaturas assim, e eu não poderia perder a chance de fazer uma foto com os três protagonistas do Aventuras em Sinnoh pelos velhos tempos.
Vim aqui só para deixar esse registro. Agora Luke, Lukas e Dawn estão prontos outra vez para se aventurarem pelo mundo! Só faltou um Pachirisu para reunirmos o grupo original de treinadores e seus Pokémon, exatamente como no primeiro header do blog feito lá em 2010. Bateu forte a saudade.
Sempre que posso eu tento tirar um tempinho para dar um "alô" aqui. Vez ou outra me deparo com comentários de novos leitores, portanto, dou-lhes as minhas boas vindas. Eu sempre recebo notificações por e-mail quando algo acontece no blog, e não se enganem, vou continuar amando conversar sobre Pokémon e fanfics.
Desejo a todos boas festas nesse fim de ano, e já aproveito para desejar que 2023 seja repleto de novas histórias para nós (e mangás, figures e cartinhas!).
A Conclusão de Sinnoh 2.022
"Está feito", disse Frodo Bolseiro.
"Sim, Sr. Frodo", respondeu Sam. "Acabou agora."
E com esse trecho de O Senhor dos Anéis em mente, me pego pensando que é a segunda vez que eu "termino" o Aventuras em Sinnoh. A primeira foi lá na Liga Pokémon em fevereiro de 2015, e de lá para cá se passaram 7 anos. Muito mais do que imaginei. Ainda me surpreendo pelo fato do blog continuar vivo, e com alguns visitantes ocasionais aqui e ali. Lá no fundo sinto que ainda sou o mesmo, porque estou sentado no mesmo lugar e usando mesmo notebook velho com quase uma década de existência.
Mas, de alguma forma, acho que TUDO está diferente. O mundo virou um lugar bem estranho.
Sinnoh 2.0 foi uma brincadeira antiga que surgiu assim que a fanfic terminou. Quando uma coisa que as pessoas gostam muito termina, é normal estar no hype e querer saber mais. Lembro que pouco tempo depois de Naruto acabar, logo vieram os boatos do filho dele, Boruto, e eu só conseguia pensar: "Isso devia ter acabado há muito tempo".
Bem, talvez o blog também tivesse de ter acabado também, mas ainda me pego passeando por aqui, lendo comentários antigos e reencontrando alguns velhos rostos quando tenho a oportunidade.
Com o término do The Post-Game, as histórias que eu tinha para contar aqui terminaram. Consegui entregar um fim que eu sempre quis dar para meus personagens, matar a saudade, e de quebra concluir umas pontas soltas que me incomodavam. Me diverti muito. Deixo meus sinceros agradecimentos ao Dento que puxou meu pé por incontáveis anos para escrever esse arco, e hoje posso vir aqui de cabeça erguida para confirmar que o terminei.
Fica o gancho para uma continuação da continuação, e quem sabe até um Aventuras em Hisui? Bom, aí já não é comigo, mas uma história começa quando um escritor se pergunta: "O que será que vem depois dessa página?"
Ontem também chegou o Vol. 1 da saga Diamond & Pearl nos mangás, e eu percebi que estou esperando essa desgraça desde 2014 quando a Panini lançou Black & White aqui no Brasil, e só agora eles voltaram à quarta geração para eu finalmente acompanhar essa obra. Venho evitando ler desde então, porque eu prometi a mim mesmo que só leria quando tivesse uma edição física em mãos, até para evitar me espelhar na história enquanto eu produzia AeS. Ainda não li o volume, mas estou ansioso para começar. Como cuidei dessa região por 12 anos, eu provavelmente vou achar bem esquisito enxergar os personagens de uma forma tão diferente *risos* Às vezes sinto que eles são só meus.
Acredito que este post marque um final para o blog como o conhecemos. Sem mais histórias. Não tenho mais nada para contar (acho que eu falei a mesma coisa em 2015, mas enfim).
Obrigado pelas memórias. Obrigado pelas visitas e comentários que ainda guardo como um pequeno tesouro. Obrigado à VOCÊ que leu e fez parte dessa história comigo.
The Post-Game 7 [FINAL]
No momento em que Amy
pôs o pé para fora do portal, ela se reteve. Todo o esquadrão da Polícia
Internacional fazia ronda e cercava o local com suas faixas amarelas com os
dizeres em letras garrafais “não
ultrapasse!” que nenhum cidadão ousava burlar. Parte da guarda costeira
de Sinnoh também fora acionada, assim como detetives, investigadores e alguns
curiosos de plantão.
A primeira reação de
Amy foi recuar um passo e voltar para dentro do Distortion World onde era mais seguro, mas Martha pediu-lhe licença
e passou em sua frente, correndo em direção dos seus sobrinhos que a aguardavam
ansiosamente. Luke e Lukas a receberam com um abraço caloroso, quase indo ao
chão no momento em que ela se jogou nos braços dos meninos.
— Tia Martha, você está bem!
Que alívio — disse Lukas com a voz chorosa.
— Me perdoem pelo susto, meus
queridos. Eu não queria... eu estava fora de mim.
— Tá tudo bem, tia —
respondeu Luke preocupado. — Nós não fazíamos ideia onde você tinha ido parar, não
temos notícias suas há meses.
— Mas se tem alguém que
conhece cada canto deste universo, essa pessoa é a Paula.
Amy, que até então apenas os
observava de longe, deu-se conta da mulher que caminhava em sua direção. Ela
era muito alta e tinha longos cabelos perolados, mas a expressão franzida e irritadiça
apagava parte da beleza e plenitude que costumava habitar seu olhar. Amy deu
dois passos para a direita e saiu da frente da fenda antes que a mulher
gritasse: “Mova-se depressa!”.
Com os braços estendidos,
Paula abriu as palmas do mão no ar e fechou os braços num movimento cruzado,
como se dobrasse as amarras do universo à própria vontade. O portal para o Distortion World retorceu-se, vibrou e
emitiu uma energia densa para então ser selado, intransponível, como sempre
deveria ter estado.
Mesmo sem entender, Amy fez
menção de agradecê-la, mas a mulher lhe deu as costas e desapareceu em um
corredor escuro da montanha. Até mesmo Luke estranhou tal atitude, o que o
levou a interrogar seu irmão:
— Tá tudo bem com a Paula?
— Ela ficou bem irritada
quando pressentiu esse portal sendo aberto... — lamentou Lukas. — Nós não
tivemos tempo de conversar muito no caminho para cá, mas ela disse que isso a
colocaria em uma séria encrenca com as outras divindades. Espero que ela
consiga resolver e tudo termine bem...
— Eu também. E falando nisso,
será que o senhor pode me explicar por que não retornou nenhuma das minhas
chamadas nos últimos dias? — falou Luke, escondendo a frustração por trás do
deboche. — Tava tão ocupado que não teve nem tempo de dizer ao seu irmãozão que
chegou bem? Hein, hein?
— Credo, você tá falando que
nem a mamãe! — brincou Lukas, afastando-o de perto de si. — Onde eu estava não
tinha sinal. E digamos que era um pouquinho... distante daqui.
— Não acredito que você foi
visitar outra região sem mim!
— De forma alguma! É só que a
Paula queria que eu conhecesse um dos planetas favoritos dela, porque eles
estão na temporada onde acontecem as supernovas.
— Ah — ele soltou uma
exclamação. — Perto de você minhas aventuras até perdem a graça.
— Eu sempre vou preferir as
nossas aventuras, Luke.
Os Irmãos Wallers guiaram
tia Martha para que ela fosse atendida pelos paramédicos. Parte da operação
havia sido organizada por tio Marshall, que estava em seus últimos anos na
polícia procurando por um substituto. Com a confusão toda envolvendo a aliança
entre Rockets e Galactics, seu intuito era manter a mídia o mais longe que
pudesse para que isso não manchasse os compromissos da Liga Pokémon ou seus
sobrinhos. Charon e os demais tiveram o laboratório apreendido e todos os
instrumentos de pesquisa confiscados, e seriam interrogados em breve. Com o
vulcão da Stark Mountain controlado,
não havia mais o que temer.
E além de Marshall,
havia outros rostos que encheram Luke e Lukas de saudades. Quando Stanley ficou
sabendo que Luke poderia estar em apuros, ele foi correndo chamar sua namorada
Vivian para dar o devido apoio moral. Não que eles pudessem oferecer grande
ajuda, mas a intenção era o que mais contava.
— A cavalaria chegou! Graças
a Arceus cheguei a tempo! — bradou Vivian, erguendo duas sacolas de
supermercado como se segurasse o Santo Graal.
— Ô, glória! Manda pra cá! —
berrou Luke do outro lado.
Vivian arremessou com
precisão um Soda Pop para cada um de
seus amigos. Havia também salgadinhos, bolachas e doces para beliscar e matar a
fome antes que desse a hora do almoço. Luke e Stanley se cumprimentaram com um
aceno só deles e brindaram a mais uma missão bem sucedida.
— A nossa sequência de
batalhas na Battle Tower ainda tá de
pé? — indagou Luke.
— Sim, eles entenderam que
era uma emergência. Não se pode controlar a barriga — brincou Stanley. — Por
sinal, a Dawn está bem depois de toda essa loucura?
— Sim, nós a levamos para a
enfermaria até que a polícia controle a situação por aqui, mas eu mesmo ainda
não a vi — falou Luke, procurando pelo chefe do setor. — Ô, tio Marshall! A
gente tá livre para ir?
— Ainda não, meu rapaz.
Preciso de vocês para preencher só mais alguns documentos — respondeu o homem
com uma prancheta em mãos. — Restaram poucos membros dos Galactic em operação,
e por sorte não houveram casualidades. Estamos investigando o paradeiro do
ex-executivo Petrel dos Rockets, mas ainda não o encontramos. Eu vou precisar
que todos os envolvidos continuem por aqui. Inclusive você, senhorita.
Marshall apontou com o lápis
na direção de Amy que tentava sair de fininho. A garota suspirou, pois a última
coisa que queria no momento era o envolvimento da polícia em seus afazeres.
Marshall entregou a prancheta para outro oficial, caminhou em sua direção e a
chamou para uma conversa em particular. Ele encostou-se à parede e retirou o
chapéu para abanar-se por conta do calor, como quem tem uma conversa casual.
— Você é a Srta. Green? —
perguntou o chefe da polícia, quase como se confirmasse.
Amy fez que sim com a cabeça,
cautelosa e impaciente.
— Entendo. Estou ciente do
seu histórico com esses criminosos.
— Isso já faz muito tempo. E
se te consola, eu mesmo vim aqui para limpar a bagunça que eles deixaram —
respondeu Amy.
— Fique tranquila, não vim
com o intuito de pressioná-la. Estou no encalço dos remanescentes dos Rockets
que estão atuando em Sinnoh há muito tempo, mas espero que esta seja a última
vez.
— O senhor não vai deixar
isso vir à tona, ou vai? — indagou Amy por fim.
— Senhorita, eu não quero
problemas. E da mesma forma que você busca discrição, eu trabalho nas sombras —
falou Marshall, e atrás dele pôde-se ver as asas de um enorme Honchkrow se
movimentarem como se fosse um sobretudo em suas costas. — Eu nunca te vi, e
você nunca me viu.
— Já até esqueci que tivemos
essa conversa — respondeu Amy, aproveitando a chance para escapar pelos fundos
antes que alguém sequer se desse conta de que Amanda Green, a herdeira dos
Rockets, pusera os pés na região. — Até logo, oficial
i
Quando Dawn acordou,
mal pôde acreditar em seus olhos. Estava de mãos dadas com sua amada Cynthia,
com todos seus amigos ao redor que não via há tanto tempo. Seus olhos se
encheram de lágrimas ao dar-se conta de que o tempo nunca seria capaz de romper
o laço que havia construído com eles, pois eles sempre iriam ao seu encontro
quando ela precisasse.
— Oh, minha pequena — Cynthia
aproximou-se e deu-lhe um beijo na testa. — Está tudo bem agora. Você está
segura.
Dawn sentou-se na maca e
levou a mão ao peito, pois ainda respirava com dificuldade. De um lado recebeu
o apoio da atual, e do outro, o ex. Quando seus olhos se encontraram com os de
Luke, ela teve um lampejo de todos os anos que passaram juntos — da segurança
que sentia e da certeza que poderia conquistar o mundo junto dele —, e do outro
estava Cynthia, por quem era perdidamente apaixonada.
— Vocês vieram por mim —
disse Dawn com a voz chorosa. — Acho que estou fadada a sempre ser a garotinha
indefesa do grupo. Me desculpem por sempre dar trabalho...
— Ai, menina, já tá falando
besteira — interrompeu Vivian, enfiando uma bolacha recheada de morango na cara
dela. — Cala a boca e come.
— O que aconteceu para que
todos viessem aqui me ver? — indagou Dawn.
— E precisa de motivo? —
perguntou Lukas. — Eu acho é que ficamos tempo demais longe. Precisamos marcar
algo com mais frequência, e sem essa de “vou ver e te aviso”. Eu quero uma
reunião da velha guarda de Sinnoh pra ontem!
Todos riram e aproveitaram o
momento de confraternização com nostalgia de sobra. Dawn ainda estava
terminando seu pacote de guloseimas quando alguém bateu à porta e pediu licença
ao entrar. O detetive Looker fez sua entrada triunfal, como se fosse uma
celebridade famosa que seria recebida ao som de aplausos e a união de inúmeras
bocas abertas em sinal “O” conforme seu sobretudo esvoaçava no ritmo do
ventilador de canto improvisado.
Mas no instante em que ele
entrou, Vivian soltou uma indagação:
— Por que tem um cara fazendo
cosplay de Detetive Wobbuffet na porta?
— Saudações. Eu sou o
Observador, mas vocês podem me chamar de Looker. Estou aqui em nome da P.I.
para verificar o bem estar da Agente D.
Todos os presentes na sala
viraram o rosto em direção de Dawn que mordiscava balinhas de jujuba coloridas.
— Quem, eu?
— Claro. Você se lembra que
este foi o codinome que eu lhe dei... não lembra? — indagou Looker, encarando
com desapontamento a expressão no rosto de Dawn. — Qual é, foi no Capítulo 8,
nem faz tanto tempo...
— Irmão, eu não lembro nem o
que eu comi ontem — respondeu Luke.
— Enfim — Looker se recompôs
e ajeitou a gravata. — Há muitos anos eu me infiltrei nessa região a fim de
estudar mais sobre as facções criminosas que atuavam em Sinnoh. Fiquei muito
tempo no encalço do executivo Proton, desde o incidente do incêndio nas
proximidades da Rota 202 para ser mais exato.
— Rapaz, isso me lembrou
aquela vez que fomos atacados por uma horda de Bidoof doidos. Vocês lembram
disso? — indagou Stanley.
— Pode crer — confirmou Luke.
— Eu achava eles inúteis na época, mas pensando hoje em dia, bem que eu queria
ter um Bidoof no time. Bidoof são maneiros.
— E foi como nos conhecemos! —
disse Vivian empolgada, abraçando Lukas ao se lembrar de como tinha uma
quedinha por ele. — Ih, foi mal. Esqueci que tenho namorado agora.
— Enfim — Looker pigarreou mais alto, tentando retomar o
assunto. — Chegou aos meus ouvidos que ele pode ter alguma conexão com a
Comandante Mars dos Galactic. O que vocês sabem sobre isso?
— Nada — Lukas balançou a
cabeça.
— Nadica de nada. Nunca ouvi esse
nome na minha vida — concordou Luke.
— Hm. Suspeito — ponderou
Looker, sem se dar por vencido. — Bem, acredito que isso agora seja tarefa para
a polícia local, então vou me abster.
— Ah, lembrei! — disse Dawn
em sinal de surpresa, apontando subitamente na direção do detetive. — A última
vez que fiquei sabendo, o senhor havia se envolvido em um tiroteio. Eu jurava
que estivesse morto.
— Morto?! Aquilo tudo foi um
disfarce para que eu saísse de cena! — retrucou Looker com convicção. — Eu me
permiti ser atingido, para que assim o inimigo não levantasse mais suspeitas
sobre meu envolvimento. Passei algumas semanas no hospital e depois saí de
licença para passar um tempo em Alola descans-- digo, trabalhando arduamente.
— Oh, estou impressionada! O
senhor planejou tudo mesmo — mencionou Dawn.
Seus amigos se entreolharam.
Só mesmo Dawn para cair na conversa daquele detetive fajuto.
— Vocês devem estar pensando
que eu não fiz nada durante minhas fér-- digo, minha missão em Alola. Pois é
justamente por esse motivo que vim aqui hoje — falou Looker, fazendo suspense. —
Vocês já ouviram falar sobre fendas?
A menção daquela palavra fez
Cynthia se levantar, como quem não deseja que aquele assunto seja levado em
diante.
— Detetive, receio que a
paciente precise descansar. O horário de visitas já encerrou.
Looker a encarou em silêncio
por alguns segundos, mas logo percebeu que estava em clara desvantagem. Por
mais que tivesse o desejo e interesse de pedir a ajuda daqueles jovens para
seguir com seu estudo sobre as fendas temporais, reconheceu que não conseguiria
nada em Sinnoh. Os Ultra Wormhole
ainda era assunto sigiloso até mesmo para as autoridades, e por mais que a
situação exigisse urgência, talvez fosse melhor não envolvê-los naquilo.
— Bem, então não era para ser
— lamentou o detetive, vestindo seu casaco. — Me desculpem se pareço
excêntrico, mas é que não posso evitar. Meu tempo em Sinnoh finalmente está
chegando ao fim agora que meu trabalho aqui está concluído.
— Mas você não fez nad--
Stanley tampou a boca de
Vivian antes que ela machucasse o pouquinho de dignidade que restava àquele
pobre homem.
Looker girou nos calcanhares
e fez um último aceno breve para os jovens heróis que fizeram parte de sua
história.
— Adeus. Que os ventos do
destino permitam que nossos caminhos voltem a se cruzar algum dia! — disse o
detetive, fazendo um som de vento com a boca para dar efeito conforme fechava a
porta, ainda mantendo contato visual.
Cynthia continuou ao lado de
Dawn para ajudá-la a reunir seus pertences e levá-la de volta para casa assim
que os médicos a liberassem. A operação da polícia estava quase no fim, e como
prometido, tio Marshall conseguira desviar toda a atenção da mídia para um
incidente envolvendo o descontrole dos Heatran que quase ocasionou na erupção
do vulcão.
Os dois irmãos se sentaram
próximos à ribanceira para observar o nascer do sol. Stanley e Vivian também se
uniram a eles, e logo o grupo que originalmente se aventurara por Sinnoh quando
criança estava reunido outra vez. A montanha dava uma bela visão do Monte
Coronet que se erguia diminuto no horizonte, assim como a região norte de
Sinnoh toda coberta de neve até a costa e o castelo da Liga Pokémon ao leste.
— Puta merda — falou Luke por
fim. — Eu amo Sinnoh. Grande parte da minha vida passou-se nessa região, e sou
muito grato por ela. Obrigado por fazerem parte disso.
— Deu de ficar todo emotivo
agora? — indagou Stanley. — Até parece que nunca mais vai voltar.
— Eu conheci muitos lugares
junto da Paula, mas devo admitir que meu coração sempre estará aqui — comentou
Lukas.
— E eu vou aonde vocês forem!
— mencionou Vivian. — O que acham de organizarmos uma nova aventura só nós
quatro, como nos velhos tempos?
— Eu topo — falou Luke. — O
que acham de semana que vem?
— Ih, já tenho compromisso —
falou Lukas.
— E nós temos a disputa da Battle Tower remarcada, cabeção —
acrescentou Stanley.
— Ô porra, mas será que gente
velha nunca consegue marcar nada? Vou ter que começar a marcar horário com três
meses de antecedência na minha agenda de celebridade — disse Vivian raivosa,
mas logo a situação toda os fez rir e concordar que a vida nunca mais seria a
mesma, e a graça estava justamente naqueles momentos tão raros e preciosos que
eles compartilhavam.
Luke ria contente quando
sentiu um minúsculo pedregulho acertar-lhe. Levou a mão à boina na cabeça e
olhou para trás a tempo de ver alguém se esconder atrás de uma árvore. Ao
reconhecê-la, ele se levantou e foi em sua direção, sendo recepcionado por Amy
que já se despedia às pressas.
— Ei. Eu quero te agradecer
pelo que fez pela nossa tia — falou Luke. — Não fazíamos ideia que ela tinha
perdido um filho e como isso a afetou. Dessa vez ela preferiu contar com a
nossa ajuda para se reabilitar, e iremos tomar conta dela.
— Família é tudo — concordou
Amy. — Vim só me despedir porque também estou voltando pra casa.
— Minha tia me contou um
pouco do que vocês passaram no Distortion
World, e... é um lugar complicado, eu também já estive lá.
— Não achei nada demais —
disse Amy como quem faz charme, mantendo em segredo absoluto tudo que
vivenciara no mundo da antimatéria. Ela puxou a boina do rapaz para baixo e
revelou aquele sorriso típico que somente Amanda Green sabia dar. — Se cuida,
campeão.
— Como sabe que conquistei
esse título? — perguntou Luke.
— Um Campeão sabe reconhecer
o outro — respondeu Amy com uma piscadela.
— Não brinca! E nós nem
tivemos uma batalha pra valer! Topa um acerto de contas definitivo?
— Vai ter que ficar para
depois — disse Amy apressada, olhando para ver se alguém mais a observava.
Lá longe Vivian forçava os
olhos para descobrir quem era a biscate que Luke estava conversando, e após
remexer suas memórias mais remotas e longínquas, ela apontou na direção de Amy
e soltou um berro que fez a montanha estremecer:
— É a mina que roubou a minha bike quando eu era criança!
— Vai ser rancorosa assim no
inferno, garota! — retrucou Amy enquanto corria na direção oposta e saltava
pelos barrancos até desaparecer do mapa.
ii
No momento em que
Cynthia girou a chave na fechadura, as duas soltaram um longo suspiro
prazeroso. A tardezinha se despedia e elas finalmente estavam em casa após
aquela loucura toda dos últimos dias. Duke estava ansioso para contar a
novidade aos seus companheiros Pokémon, mas ao dar o primeiro passo, suas patas
desengonçadas escorregaram em sabão e ele foi deslizando pelo chão como se
estivesse em uma pista de gelo.
Dawn e Cynthia largaram
as malas na varanda ao se darem conta da música alta que vinha da festança que
acontecia na piscina. Buck contratara um DJ que agitava com as músicas mais
badaladas do momento, ele também convidara algumas amigas para desfilarem de
biquíni enquanto Cheryl cuidava dos comes e bebes. Até mesmo Riley descansava
em uma boia com o formato de Lapras tomando um refresco. Todas as cascatas
estavam ligadas, as luzes coloridas cortavam o céu como holofotes. Algum doido
até mesmo saltou da sacada no segundo andar, fazendo um tremendo splash! que jogou água para todos os
lados.
Verity ao menos não
parava quieta no meio de toda aquela gente, e ela parecia estar adorando! Nunca
antes Cynthia a vira se divertindo tanto, principalmente por tê-la mantido
muito tempo trancada dentro de casa, sem contato com o restante do mundo.
— Calma. Respira. Nós vamos
arrumar tudo — disse Dawn bem lentamente, pronta para acalmar os
nervos de sua companheira.
Mas, para sua surpresa, Cynthia
começou a rir.
— Quer saber? Que se dane.
Ela arrancou as roupas da
viagem, ficando apenas com as roupas de baixo que mais pareciam com um top e
uma calça de ginástica. Ela não devia mais nada a ninguém, e estava cansada de
viver escondida dos olhos da mídia que teimaria em caçá-la até os confins do
mundo para denegrir a sua imagem. Dessa vez seria diferente. Ao invés de:
“Ex-campeã é vista causando tumulto em sua casa de veraneio”, seria muito mais
interessante a manchete: “Ex-campeã sede a maior festa da última década!”.
Dawn chamou Duke, ainda se
acostumando com o fato de que não poderia mais levá-lo no colo. O Prinplup
parecia muito contente com sua nova forma, e tanto Milady quanto Isaac ficaram
extremamente orgulhosos da evolução do estimado filhote.
O pinguim subiu até o topo da
cachoeira artificial e deu um salto com Verity em suas costas. Buck e os demais
aplaudiram a manobra, e mandaram mais uma rodada de refrigerante e muita
espuma.
Tudo naquele mundo era tão
diferente e novo para a garotinha. Cynthia tomou a filha nos braços e a ergueu
no alto, e junto de Dawn elas abraçaram a menina cujo sorriso não cabia mais no
rosto.
—
Obrigada! Obrigada! Obrigada! Vocês são as melhores mamães que eu poderia
pedir! — disse Verity, explodindo de alegria.
— Oh, minha querida... Você é
o meu presente dos céus — falou Cynthia com a voz mansa.
— Eu não quero voltar —
contou a pequena. — Aqui é muito mais legal do que Hisui. Por favor, se eu
puder ficar mais um pouquinho...
— Ninguém vai te tirar de
nós. Nunca — Cynthia assegurou-lhe. — Seu segredo está seguro conosco. E se
algum dia você tiver de voltar para o lugar de onde veio, pode ter certeza que
suas mamães irão buscá-la. Nem que para isso precisemos enfrentar as
divindades!
— Eu amo vocês!
Verity as envolveu em seus
bracinhos e desejou nunca despertar daquele sonho.
iii
49º
andar, 49ª vitória. A última vez que Luke sentira suas mãos tremerem tanto
havia sido na batalha contra Ike Smithsonian na Liga Pokémon. Stanley se
aquecia no banco ao lado, com os três melhores de seu time prontos para a
batalha em dupla. Fire Tales e Red Fortress reunidos. Os holofotes todos
centralizados neles.
— E
lá vamos nós outra vez — disse Stanley a um dado momento. — Vai ficar com dor
de barriga de novo?
Luke
limpou o suor da testa, procurando se concentrar.
—
Eu nunca pensei que fosse ficar tão ansioso por enfrentar o tio Palmer em
batalha.
—
Qual é, você cresceu vendo o meu velho dormindo no sofá de casa depois do
almoço. Tem como ser intimidado por isso? — brincou Stanley. — Só mais uma
batalha e batemos o nosso recorde. Quem derrota o Tower Tycoon recebe uma
medalha oficial. E como o bom colecionador que você é, aposto que vai querer
uma dessas no seu Garchomp.
—
Ô, se quero. Eu vim aqui pra isso — confirmou Luke, terminando de alongar os
braços. — Então ‘simbora que essa
batalha vai entrar pra história!
No
momento em que a porta do ginásio se abriu, uma multidão aplaudiu a chegada de
Luke Wallers e Stanley Tycoon ao 50º andar da torre. Ainda havia uma longa
caminhada rumo à 100º vitória consecutiva, um marco que pouquíssimos
treinadores na história haviam conquistado, mas a batalha de Nº 50 era muito
aguardada pela força do adversário e seus convidados ocasionais.
Palmer
estava do outro lado da arena, aguardando de braços cruzados. Ele parecia calmo
e tranquilo como Stanley por fora, mas sabia que era só questão da batalha
começar para que os dois liberassem tudo que vinham guardando.
Luke
preparou a Dusk Ball de seu Garchomp
e Stanley fez o mesmo com a pokébola de seu Torterra, mas antes que a batalha
tivesse início, Palmer fez um sinal e pediu que eles aguardassem.
—
Só um minutinho. Meu parceiro de batalha ainda não chegou.
Como
se tudo tivesse sido combinado, uma abertura no chão se abriu exalando fumaça
por toda a arena. A plateia aguardou ansiosamente a chegada da figura
misteriosa que se erguia, e então uma mulher soltou um grito ensurdecedor que
foi seguido por milhares de outros que preencheram a torre de comoção e
euforia.
Viu-se
um homem elegante de terno e braços estendidos, usando seus óculos escuros e
com a barba um pouco mais grisalha do que anos atrás. Walter Wallers,
ex-campeão de Sinnoh e pai de Luke revelou-se como o parceiro de Palmer para
aquela batalha em duplas. A multidão agora estava mil vezes mais empolgada,
fazia quase duas décadas que ninguém via Walter participar de uma disputa
Pokémon oficial.
Walter
retirou os óculos escuros e revelou um sorriso franco na direção de seus
adversários.
— E
aí, filhão. Gostou da surpresa?
— A
gente tá fodido — concluiu Luke do outro lado.
— É — concordou Stanley, sem
mais nada a acrescentar.
Luke e Stanley jamais
ultrapassaram o 50º andar da torre.
iv
Paula estava parada diante
das ruínas no Spear Pillar. A mulher
fechou os olhos e seu corpo foi envolvido por uma luz ofuscante, expandindo em
proporções até transformá-la em sua forma original. Palkia, a entidade
controladora do espaço, fora convocada para uma reunião do Grande Conselho dos
Pokémon Lendários que só acontecia quando o equilíbrio do mundo se via afetado.
Aquilo não era um bom sinal.
Um feixe de luz cortou o
horizonte e atingiu o cume da montanha. O mármore branco refletia os degraus
mágicos que se formavam em direção aos céus em uma escadaria infinda. Palkia
começou então sua longa subida rumo ao Templo de Arceus, onde tudo tivera início.
A guardiã cumpriu todo o
percurso em silêncio, como se sofresse sua penitência. Estava ciente do que
iria acontecer, mas vinha tentando adiar aquilo há muito tempo.
Quando o som e a luz por fim
não puderam mais acompanhá-la, Palkia se viu diante do grande tribunal. Acima
dela estava Arceus em sua onipotência, cujos mil braços moldaram o mundo como
ele era. À sua direita estava Dialga, seu irmão de criação, à esquerda de
Giratina cujo olhar ardiloso pousava na Guardiã do Tempo.
“Pearlutina Palkia”, disse a
voz de Arceus que preenchia todos os lugares. “Tu estás diante de teu Criador
porque não cumpriste com tua tarefa. As fendas continuam a aparecer, ameaçando
a realidade como a conhecemos. Isto deve cessar”.
“Eu venho cumprindo minha
obrigação desde minha existência, meu Senhor”, respondeu Palkia. “Não voltará a
se repetir”.
“Não mesmo?”, indagou
Giratina com a voz capciosa. “Pois eu lhe digo que uma humana adentrou meus
domínios quando me foi prometido que isto nunca mais voltaria a acontecer. E
adivinhem? Repetiu-se, um sopro para nossa existência. Está se tornando mais
comum do que imaginávamos.”
“Tu és a protetora do espaço,
mas o que resta se não fores capaz de exercer tua função?”, indagou Arceus.
“O que me resta?”, indagou Palkia,
cada vez mais furiosa. “A cada ciclo humano sou privada daquilo que mais amo.
Se me resta algo, são as correntes às quais sou incumbida”. Palkia ergueu os
braços e mostrou as amarras perpétuas. “Pai, alguma vez eu o desapontei? Por
que exiges tanto de mim e não fazes o mesmo com meus irmãos? O que lhe ofereço
nunca será o suficiente?”.
“Teus irmãos estão exatamente
onde deveriam estar”, respondeu Arceus. “Ofereces teu tempo aos homens, e já
não a vejo mais entre as divindades. Estás te tornando parte deles”.
“Os humanos são perigosos”,
mencionou Giratina. “Cada dia mais ousados, e não me surpreenderia se logo
decidissem por desafiar até mesmo a ti, meu Pai.”
“Eles são sua criação, como
todos nós!”, disse Palkia em sinal de frustração.
Arceus escutou cada um dos
argumentos em silêncio, e meditou por muito tempo sobre qual decisão tomar.
Giratina exigia cautela, e enxergava através da maldade e do desejo por poder
dos humanos que um dia eles iriam se rebelar. Palkia desde sempre acreditara no
amor, enxergava com curiosidade a busca pelo conhecimento, orgulhava-se da
força de vontade e regozijava-se por todas as emoções que um simples humano
poderia causar mesmo em uma entidade como ela.
Sentia muito a falta de
Lukas, e lutaria até o fim para preservar o mundo onde ele vivia.
“Dialga”, Arceus o chamou por
fim. “Estás em silêncio há muito tempo. O que tens a dizer?”.
O Guardião do Tempo encarou
sua irmã com quem compartilhava um vínculo mútuo atemporal. Ele não escondia
sua frustração em saber que Pearlutina vinha se ausentando da vida nos céus,
que todo seu tempo e pensamento eram dedicados aos humanos. A falha nas
rupturas do espaço vinha se tornando frequentes, pois agora ela não sabia como dividir
a vida como divindade de sua forma ordinária.
“Eu sinto sua falta, minha
irmã”, lamentou Dialga.
“Mas eu ainda estou aqui”,
retrucou Palkia. “E sempre estarei.”
“Não. Você não pode mais me
ceder o seu tempo, pois precisa do seu espaço agora.”
“Não seja egoísta. Logo você,
que tem todo o tempo do mundo!”
“Silêncio!”,
bradou Arceus. “Sinto as emoções no coração de cada um, e com isto chego ao meu
veredito final. Pearlutina Palkia, tu serás proibida de visitar o mundo dos
humanos pelo próximo milênio, ou até que livre-se de toda esta raiva que habita
em teu coração.”
As correntes nos braços de
Palkia a apertaram com mais força. Sua angústia foi tamanha que os céus
estremeceram e uma galáxia inteira foi fendida. Giratina enrolou-se relutante e
Dialga lamentou que sua irmã sofresse por seus atos. Arceus manteve-se firme em
sua decisão, e dela não abriu mão.
Mil anos. Nunca mais voltaria
a encontrar Lukas naquela existência. Demoraria muito tempo até encontrar seu
herdeiro, aprender a conhecê-lo do zero, descobrir seus trejeitos e características
que tanto adorava, mas e se ele passasse a temê-la? O mundo já teria mudado de
forma, e talvez nem existissem mais humanos até lá. Mil anos podiam passar como
um sopro para as divindades, mas seus olhos se encontraram com os de Dialga e
ela sentiu uma raiva que não poderia ser medida.
“Eu nunca irei perdoá-lo”,
vociferou Palkia, consolidando a rivalidade que desde tempos imemoriais vinha
sendo evitada. “Você pagará pelo seu silêncio”.
“Não permitirei nenhuma
ameaça em solo sagrado”, bradou Arceus. “Contenha-se”.
“Vocês estão tentando me
transformar na vilã dessa história”, respondeu Palkia, dando as costas para sua
família e para todos os valores que conhecia. “E, quando isso acontecer, terão
de lidar com as consequências”.
The Post-Game 6
Pokémon P.O.V. [Point
of View, em homenagem aos velhos tempos!]
O Garchomp desviou-se
bem a tempo de escapar de um golpe letal da Pidgeot que desceu com um rasante
feito um torpedo. Suas bicadas feriam com a força penetrante de uma lança, e
suas asas cortavam o próprio vento como se fossem lâminas de aço. Nenhuma
tentativa de usar o Stone Edge
funcionara, e só lhe restava energia para uma última investida.
A Pidgeot alçou voo e
fez uma parábola no ar, os olhos de águia agora fixos em seu adversário. Aerus
preparou-se para atingi-la em uma última tentativa desesperada. Quando desceu
com um Brave Bird, mirou a ponte de
pedras e errou por um triz, sendo atingido no ombro e arremessado no chão com a
colisão. A Pidgeot, entretanto, não se deu conta de um tiro vindo de fora da
batalha que a atingiu na asa direita que começou a fumegar e queimar,
comprometendo seu voo.
— Mayday! Mayday! — A
Pidgeot fez a curva a tempo de amenizar o impacto, mas acabou por
estrebuchar-se no chão e por pouco não quebrar uma das asas no processo. Se não
fosse uma aviadora tão experiente, poderia ter dado fim à sua carreira ali
mesmo.
— Quem
foi o filho de uma meretriz que se meteu no meio da nossa batalha?! —
Aerus berrou furioso, procurando o culpado pelo disparo.
— Não olha pra mim. Meus
tiros não são de fogo — Mikau respondeu logo atrás como quem só quer debochar.
Havia um exército de Heatran
aproximando-se da montanha, emergindo dos rios de lava e infestando as paredes
até que estivessem cobertas. Um deles fez um disparo contra o Garchomp que se
defendeu com suas lâminas que imediatamente começaram a derreter dado o calor
absurdo do magma.
— Parece que estamos
encurralados — disse General. O Dusknoir envolveu sua amada, Froslass, ao redor
dos braços, pronto para protegê-la de qualquer ataque.
— Eu posso tentar conter o
calor, mas são muitos — respondeu Glaciallis.
— Esse era um bom momento
para a guilda estar completa. Cadê o resto do pessoal? — indagou Sophie, a Gardevoir.
— Teremos de nos virar com as
armas que temos em mãos — acrescentou Chaud, o Bastiodon, com seu escudo pronto
para repelir.
O grupo de seis Pokémon
formou um círculo conforme os Heatran furiosos os cercavam, fechando cada vez
mais o cerco. As criaturas metálicas pareciam dispostas a ferir e até matar os
invasores que haviam profanado seu templo sagrado. Não que eles tivessem culpa,
cabia a uma guilda de Pokémon obedecer às ordens de seu treinador, e no momento
sua prioridade era escapar dali com vida.
— Alguém coloca aí o tema dos
Vingadores pra bater a inspiração? — caçoou Aerus.
— Eu nem sei o que é isso,
mas se tem vingança e sexo, então eu gosto — respondeu Mikau com seus tiros certeiros prontos
para atingir o alvo.
O primeiro Heatran deu um
salto na direção do grupo, e foi imediatamente atingido por um Hydro Pump na cabeça. À esquerda de
Mikau, Glaciallis congelava três deles na medida em que General e Chaud
montavam uma barreira ao seu redor. Sophie previu através de seu Future Sight que cinco deles cairiam, e
na sequência uma explosão psíquica os mandou pelos ares.
Aerus estava na linha de
frente do combate quando percebeu que seus inimigos formaram uma fileira e
abriram espaço para seu líder. Um Heatran maior do que qualquer outro
aproximou-se suntuoso, armado até a cabeça em ferro e metal e cuja espada
flamejante fumegava em uma das mãos.
— Você deve ser o alfa —
presumiu o Garchomp.
O cavaleiro não disse palavra
alguma, mas a espada zuniu em sua mão pronta para o embate. Aerus defendeu-se
da primeira investida, buscando a melhor alternativa de enfrentá-lo sem
utilizar seu melhor golpe. O Earthquake
era uma técnica perigosa. Com todos seus companheiros por perto, o golpe
acabaria por atingi-los e até comprometer a estrutura da montanha. O cavaleiro
não estava para brincadeira, continuou a avançar com ferocidade, dominado por
uma fúria avassaladora. Existia certa sutileza na forma como sua espada era
empunhada, deixando um rastro de fagulhas e brilho incandescente que cortava o
ar.
Aerus ativou suas lâminas e
usou o Dragon Claw bem no peito do
cavaleiro, fincando-as na armadura de aço. Para o seu azar, elas ficaram
presas, o que deu a abertura para que seu oponente lhe devolvesse uma cabeçada
que o fez enxergar estrelas.
Sophie correu para
socorrê-lo, dando cobertura através do Heal
Pulse para que recuperasse a energia. Mikau estava começando a ficar sem munição,
e os Heatran inferiores continuavam a proteger seu alfa.
O grupo viu-se encurralado
mais uma vez, pressionados contra o abismo de lava sobre eles. Os Fire Tales
podiam ter muitas histórias para compartilhar ao redor de uma fogueira quente,
mas encarar todo um exército da guilda vulcânica era suicídio.
O cavaleiro marchava com
passos pesados, aguardando a rendição. Agarrou Aerus pela garganta e o ergueu à
sua altura. Só se enxergava um par de olhos alaranjados por baixo do elmo que protegia
sua cabeça como uma coroa. Sua voz gutural espalhava terror e insegurança:
— Vão se arrepender de ter
pisado em solo sagrado — disse o cavaleiro.
— É que tenho o costume de
entrar sem ser convidado pra festa — murmurou Aerus que nunca perdia a chance
de provocar alguém.
A manopla de ferro começou a pressioná-lo
com mais força, mas um tiro o atingiu com precisão no ombro e o fez soltar com
um grito de dor. Mikau estava sem munição, então quem poderia ter sido?
Na abertura mais distante da
caverna, o Gyarados de Amy certificou-se de que o próximo seria na cabeça, pois
seu título como um dos maiores atiradores de Kanto o presidia. A guilda de
Pidgeot veio ao seu resgate, trazendo consigo o Primeape campeão de luta dos
pesos médios, a Sneasel que atuava nas sombras como assassina de aluguel, o
Venomoth cujos venenos letais derrubavam reinos e o Gengar Shiny que se
limitava a rir e caçoar da situação.
As duas guildas uniram forças
para controlar a batalha, combatendo um a um os soldados vulcânicos que
protegiam o templo até que não sobrasse nenhum. O Cavaleiro de Fogo se reergueu,
e sua espada ardeu como um farol na escuridão. Aerus estava pronto para seu
embate final quando percebeu que o som da batalha cessou, e nenhum de seus
companheiros lutava mais.
Olhou para trás por
curiosidade e avistou uma única mulher erguer-se contra todos eles. Era uma
descendente da tribo ancestral dos Garchomp, alta, esguia e de porte invejável
como uma rainha de outrora. O mero vislumbre de alguém tão importante capaz de
emanar uma aura esmagadora como aquela o fez pensar em Titânia, e seu coração
se encheu de saudade. General e Chaud fizeram uma mesura ao reconhecerem a
ilustríssima figura, e até mesmo Mikau intimidou-se diante de sua presença.
Aerus precisou retirar seus óculos escuros assim que ela passou ao seu lado.
— V-você... — Seus lábios
tremiam ao dizer seu nome.
— Kayla. O prazer é todo seu.
Vim em nome de minha mestra, Cynthia, para colocar um fim em toda essa guerra
desnecessária — respondeu a Garchomp, convicta. — Se continuarem lutando, ambos
os lados sofrerão casualidades. E se alguém ainda quiser lutar... então venha.
Eu serei sua adversária.
Um a um, os soldados Heatran
largaram suas espadas e se renderam. Mesmo os Fire Tales reconheceram que a
mera presença dela era o bastante para fazer qualquer um abaixar as armas.
Porém, o Cavaleiro de Fogo não se deu por intimidado, e com velocidade impressionante
ergueu sua espada flamejante contra ela. Kayla limitou-se a erguer sua lâmina,
e sem que qualquer um pudesse acompanhar seu movimento, o inimigo foi atingido
tantas vezes que sua armadura inteira se rompeu, sendo completamente retalhada.
Tendo sido derrotado em
combate, todos puderam ver o verdadeiro rosto do cavaleiro. Era uma mulher de
cabelos vermelhos e olhos incansáveis, pingando suor após a exaustiva batalha.
Sua visão ficou turva, as pernas cederam e seu corpo fraquejou para a direita, mas
Aerus lhe deu apoio para que continuasse de pé.
— Um líder não pode cair na
frente de seus homens — disse o Garchomp.
A cavaleira sorriu e
concordou, passando a admirá-lo ainda mais.
— Você é mesmo tudo aquilo
que falam e mais um pouco.
— Pra conhecer mais de mim,
só convivendo com esse bando de loucos que chamo de família — brincou Aerus,
deixando no ar um convite indireto para que ela se juntasse aos Fire Tales.
Com a situação controlada,
sua atenção voltou-se à Garchomp, uma das primeiras a consagrar-se campeã no
Torneio das Guildas e provavelmente a figura mais forte e influente em todo o
reino. Aerus aproximou-se dela de queixo erguido, e quem não o conhecia
imaginou que ali aconteceria um embate entre alfas para disputar quem era o
mais poderoso; embora seus amigos de longa data da guilda soubessem bem o que
ele estava para trazer.
— Eu não acredito que to te conhecendo! Eu sou
seu maior fã! — disse Aerus explodindo de empolgação como uma criancinha que
encontra seu ídolo pela primeira vez. — Mano do céu, esse é o dia mais feliz da
minha vida! Digo, talvez seja o segundo, porque antes vem o nascimento da minha
filha; mas posso dizer com certeza que conhecer você estava na minha listinha!
— Encantada — correspondeu
Kayla, acostumada com os fãs.
— Será que... você podia
assinar o meu tanquinho?
— Aerus, essa não é uma boa
ideia... — General estava para acrescentar o fato de que Titânia não iria
gostar nem um pouco de ver o nome de outra mulher escrito na barriga de seu
macho, mas Mikau fez menção que ele ficasse quieto só para ver o circo pegar
fogo.
— Vocês da Fire Tales são
mesmo uma figura! — brincou Kayla.
— Quer dizer que a senhorita
já ouviu falar sobre nós? — perguntou Chaud.
— Se ouvi? Garoto, vocês me
inspiraram a voltar. Se tivermos a chance, eu adoraria poder enfrentá-los no
Torneio de Guildas algum dia. Sem fatalidades dessa vez, claro.
— Pode deixar que eu me
comprometo a reunir o bando! — disse Aerus contente. — Nós não paramos de
treinar desde que nos consagramos campeões aquele ano. Olhando para trás,
passou mesmo um tempão... E quer saber? Eu senti saudade de tudo isso. Estamos
ansiosos para voltar!
i
Luke arremessou a Dusk Ball que acertou com precisão a
Heatran fêmea que acabara de ser derrotada. A pokébola tremeluziu três vezes
antes de confirmar a captura do Lendário Pokémon. As demais criaturas
vulcânicas retornaram para dentro de seus buracos e rios de magma,
escondendo-se assustados quando perceberam que a situação se agravara.
— Acho que nossa batalha meio
que fugiu do controle — mencionou Amy.
Luke olhou para o alto e
percebeu que a montanha estava, de fato, ruindo.
— É. Deu ruim.
— Está acontecendo.
Finalmente meu plano está tomando forma — murmurou o Profº Charon, escondido
atrás de uma pedra.
Através da interferência da Magma Stone e o caos gerado pelos
Heatran, o vulcão adormecido sob a Stark
Mountain estava prestes a explodir. Amy retornou seus Pokémon, convicta de
que agora tinha um objetivo muito mais importante para resolver do que limpar a
sujeira deixada pelos Rockets. Muito distante dali, Luke pôde avistar Cynthia
acenando com um dos braços. Ela estava em uma área elevada no interior da
montanha, e enviara sua Garchomp para auxiliar na batalha. Junto dela estava
Dawn, em segurança, o que aquietou o coração de Luke e o permitiu concentrar-se
em outros problemas.
— Temos que impedir esse
vulcão de entrar em erupção, ou colocaremos em risco a vida de milhares de
pessoas que vivem nessa ilha — Luke contou para Amy, buscando algum conselho.
A moça por sua vez não tardou
a perceber que alguém se escondia ali perto. Quando Charon tentou escapar, ela
deu um pisão em seu jaleco e o fez tropeçar e ir de cara ao chão.
— Você é quem está por trás
disso tudo, não é? Diga-me agora o que temos de fazer para reverter essa
situação — Amy o confrontou.
— Nada. Vocês não precisam
fazer absolutamente nada — retrucou Charon. — Isso não é irônico?
— O que está tentando
insinuar? — indagou o rapaz.
— Luke Wallers — Charon
dirigiu-se a ele. — Você não percebe como sua vida é abençoada? Todas as coisas
se ajeitam para você e seu irmão, mesmo que através de soluções impossíveis
como um tremendo deus ex-machina.
Você sempre tem a certeza de que tudo vai terminar bem, não é? É como se vocês
fossem abençoados... pelas divindades.
Uma enorme rocha desgrudou-se
do teto e por pouco não os atingiu. Luke começou a juntar as peças e só
conseguiu pensar em seu irmão. Lukas namorava uma deusa. A mulher que eles conheciam como Paula não passava do
disfarce de uma entidade divina capaz de controlar as dimensões do espaço,
alterando a realidade a bel prazer. Seu nome verdadeiro era Pearlutina, e era
inegável o quanto sua proteção afetara sua jornada. Estaria aquele tempo todo apostando
tão alto porque o destino estava do seu lado?
— Está insinuando que tudo
que eu conquistei foi mera sorte? — questionou Luke furioso, puxando o velho
cientista pela gola.
— Eu não chamaria de sorte —
ponderou Charon. — Mas é inegável que alguém
quis que você chegasse até aqui, não acha?
Lava começou a ser expelida,
e o calor estava prestes a se tornar insuportável. Amy chamou por Cosmo e Star
e ordenou que eles ajudassem na evacuação de quem quer que ainda estivesse
preso dentro do laboratório dos Galactic. Enquanto se preparavam para a fuga, a
Comandante Mars deu as caras, mas acabou por encontrar-se com quem não
gostaria.
— Tia Martha? — Luke esboçou
surpresa ao vê-la. — Por onde você esteve? Estávamos todos procurando por você.
Mamãe não tem notícias sua há meses...
— E-eu... — A Comandante
pareceu acuada, e não quis lhe dar satisfações. — Me perdoe.
Martha correu na direção
oposta, abandonando seu compromisso com os Galactics e também a sua segurança.
Luke estava para ir atrás dela quando Amy o impediu.
— O que você tá fazendo?! Ela
é a minha tia!
— Deixa que eu resolvo —
retrucou Amy. — Ela está passando por algo que nenhum de vocês entenderia. Eu
prometo que irei trazê-la de volta. Concentre-se em ajudar as pessoas a
evacuarem a montanha em segurança.
Ainda que não a conhecesse
tão bem, Luke sabia que podia confiar em uma treinadora tão forte e capacitada.
Deixou a caverna às pressas enquanto Amy corria em direção do perigo atrás de
Martha, cada vez mais fundo no coração da montanha.
Martha estava surda para tudo
que se movesse. Sua dor era tanta que ela já não conseguia escutar a razão. Amy
chamou seu nome mais de uma vez, mas sem resposta. Não podia chamar sua Pidgeot
que seria um alvo fácil pelas pedras que despencavam. Subiu escadarias
ancestrais e quase a perdeu de vista quando tropeçou e ralou o joelho. Estava
se esforçando até demais por uma pessoa desconhecida.
“Ei. Mas essa é a Amy que eu
conheço. Sempre colocando o bem estar do próximo acima do seu”, ela pensou na
voz de Ethan que a apoiaria mesmo na pior das situações.
— Não. Eu sou egoísta e só
faço o que me beneficia — ela pensou em voz alta, tentando se sabotar. — Quando
foi a última vez que quase me sacrifiquei para salvar alguém que eu amava?
“Se eu estou aqui, é por sua
causa. Então trate de voltar pra mim.”
— Merda — ela chacoalhou a
cabeça, livrando-se daqueles pensamentos ao perceber o quanto ainda era
apaixonada por ele. — Não me espere acordado, amor.
Assim que alcançou o cume da
montanha, Amy percebeu que estava em uma sala sem saída. Martha estava parada
no fim dela, encarando a parede como se esperasse que alguma coisa saltasse
dali.
— Ainda não acabou —
mencionou Martha, procurando algum sinal. — Eu vi acontecer na primeira vez.
Sempre acontece à iminência de alguma tragédia. Está quase chegando.
Amy ajeitou seu chapéu ao
perceber que uma lufada de ar consumiu a câmara. Entre as rochas daquela sala
remota, uma fenda rachou a matéria e abriu um portal para outra dimensão.
Parecia que uma parede de vidro havia se trincado por completo, dando espaço
para uma abertura que levava a outra realidade.
Amy jamais ouvira falar sobre
algo parecido, mas quando se deu conta de que Martha iria pular dentro da
fenda, só soube que precisaria segui-la.
ii
As duas saltaram no portal,
sendo transferidas para um mundo paralelo ao que viviam. Assim que abriu os
olhos, Amy levou um susto com pequenos pedaços de rocha que flutuavam em sua
frente como se não houvesse gravidade. Levantou-se e viu que o céu estava
púrpuro, e não havia estrela alguma.
— Que lugar é esse? —
perguntou Amy.
— É o Distortion World — concluiu Mars, incrédula. — Eu sabia que ele
existia, mas não pensei que... eu não achava que seria capaz de encontrá-lo.
— Nós causamos isso?
— Sim. O Profº Charon vinha
estudando uma forma de abrir fendas para outros mundos, e descobriu que isso
acontecia com certa frequência quando meus sobrinhos estavam envolvidos. Não
tente dar sentido a esse lugar.
— E o que encontraremos desse
lado? — Amy a pressionou, mas Martha começou a correr em busca de algo.
Ou alguém.
As duas corriam apressadas
saltando entre pedras e plataformas que flutuavam. Não se escutava som algum,
não havia nada naquele mundo imaterial onde todas as leis conhecidas não tinham
efeito. Quando deu-se conta, Amy estava de ponta cabeça e Mars passava
repetidas vezes por ela sem sair do lugar.
— Martha, espere! Por que você
veio aqui? O que procura? — perguntou Amy.
— Eu vim buscar o meu filho —
ela respondeu com convicção.
Amy começou a reunir os
fatos. Seria aquele mundo uma espécie de inferno na mitologia de Sinnoh? Se ali
se encontravam todas as pessoas falecidas, torcia para que nenhum fantasma
viesse assombrá-la, ou teria sérios problemas.
Martha não pensava em seu
falecido chefe, Cyrus, nem em qualquer outra pessoa do passado que gostaria de
rever. Só conseguia pensar em seu filho, e aquele sentimento desesperado fez
suas pernas se moverem.
A única certeza que tinham
era de que não estavam sozinhas. Era impossível que um local sagrado como
aquele não tivesse o seu protetor. Estavam andando sem sair do lugar, mas em
algum momento a Comandante Mars simplesmente parou e sentiu o corpo congelar.
Amy não deu nem mais um passo.
Havia uma gigantesca serpente
adormecida no núcleo daquele mundo. A criatura de escamas prateadas estava
enrolada em si própria, repousando em silêncio absoluto. Sua dimensão
ultrapassava os sete metros, e suas asas retraídas se pareciam com as de um
demônio. Amy fez sinal de silêncio, ao qual Mars obedeceu.
— “Vá.” — A treinadora abriu
a boca sem emitir som algum.
— “Para onde?” — perguntou
Mars em silêncio, assustada demais para reagir.
— “Buscar o seu filho.”
Quando se deu conta, a
serpente abriu um dos olhos. Mars correu para a direita e não olhou para trás.
Amy continuou escondida atrás de uma pedra ao passo que a serpente se contorcia
inteira como se despertasse do sono de mil anos com uma fome voraz. Seu
objetivo era desviar a atenção de Martha e, quem sabe com um pouco de sorte,
sair dali com vida.
Martha não soube exatamente
para onde seguir, mas confiou que seu instinto a guiasse. Havia inúmeras saídas
do Distortion World, fendas que
levavam a lugares no universo dos quais ela nem poderia sonhar, mas somente uma
delas a levaria de volta ao seu lar.
Ela procurou, procurou e
procurou. Olhava para seu interior esperando que a resposta estivesse ali,
nítida em sua frente. Viu lugares estranhos, mundo futuristas e terras de um
passado esquecido. O que chamou sua atenção em uma das fendas foi a imagem de
uma mulher com cabelos vermelhos muito parecidos com o seu. Martha parou e se
aproximou devagar com a mão estendida.
— Esta... esta sou eu? —
perguntou-se ela.
Quase não se reconhecia. Era
uma versão mais jovem, muito mais bonita e atraente. Sentiu-se horrível por ter
o corpo ferido, e aquilo só a fez pensar que nunca devia ter se tornado mãe.
Mas a verdade era que sentia inveja de sua irmã adotiva, Melyssa, que concedeu
a vida a Luke e Lukas, dois verdadeiros campeões.
— Não é justo — Martha
lamentou em seu silêncio, indo de joelhos ao chão. — Não é justo. Não é justo.
E então, ela ouviu um
chamado. Alguém a chamou de “mãe”. Martha ergueu os olhos e procurou dentro de
cada uma das fendas, mas não via sua criança. Começou a se arrastar por entre o
chão de poeira, triste e esgotada com tudo aquilo, mas o chamado se repetiu.
“Mãe, você está aí?”
— Sim. Sim, querido, onde você
está? Como posso vê-lo?
Martha abriu os olhos e
encarou uma fenda onde se via um rapaz belo de cabelos vermelhos como os seus,
mas com os traços de Proton, seu marido. Ela soube na mesma hora que aquele era
o seu filho, talvez vindo de outro universo onde ele havia sobrevivido e,
assim, puderam viver uma vida felizes juntos.
— Você é tão lindo... —
Martha murmurou com os lábios ressecados, tentando esticar a mão para tocá-lo,
mas em vão.
O rapaz ergueu a mão e quis
retribuir o gesto, mesmo que não sentisse.
“Eu estou bem, mamãe. Senti a
sua falta.”
— Eu também, querido, todos
os dias. Queria estar ao seu lado para sempre.
“Não é certo na natureza que
um filho se vá antes daqueles que o geraram. Esta não é a ordem das coisas. No
seu mundo eu posso ter partido cedo demais, mas, no meu, você nos deixou para
que eu pudesse viver.”
— Então... eu morri? —
indagou Martha com preocupação. — Quem cuidou de você e sua irmã?
“Nós tivemos de aprender a
nos virar. Sem uma mãe, a vida não tem tanta graça. Mas você precisa continuar
sendo uma por inteiro para cuidar daqueles que ainda estão ao seu lado. Não
desista deles.”
Martha fechou o punho e quis
abraçá-lo, mas aquela realidade era tão cruel que nem aquilo ela tinha o
direito. Acenou com a cabeça e prometeu dar o seu melhor. Tinha perdido um
filho, mas sua primeira filha ainda estava ali por ela. Proton a amava e
protegeria enquanto tivesse forças para respirar.
Sentiu-se ingrata por ter
agido daquela forma, abandonando sua única família. Era hora de voltar e pedir
perdão para quem sabe assim tivesse a chance de recomeçar. Martha encarou
dentro da fenda para tentar guardar na memória a imagem do filho. Pensar que em
algum lugar ele crescera para se tornar um rapaz tão bonito a fez sentir-se
orgulhosa, pois todo pai deseja acima de tudo que seu filho obtenha sucesso.
Não precisava compará-lo com seus sobrinhos, ele podia não ser nenhum Campeão
ou Top Coordenador, mas aos seus olhos sempre seria especial — pois era o seu filho.
— Mamãe te ama — Martha
murmurou baixinho antes que o portal se fechasse. — Prometo que um dia vamos nos
reencontrar.
Giratina sabia que alguém
invadira sua morada. Com um sibilo, Amy teve a impressão de que pôde escutar
uma voz como se conversasse com um humano.
“Como entrou aqui?”,
perguntou Giratina. A serpente oscilava sua atenção, deixando claro que ainda
não sabia exatamente onde ela se encontrava, embora soubesse que estava ali.
“Faz muito tempo que não recebo visitas.”
Amy sentiu o coração disparar
e a respiração ficar mais densa. E Giratina também sabia disso.
“Não fique nervosa. Eu não
lhe farei mal algum”, disse a serpente ardilosa. “Saia das sombras para que eu
a veja.”
A garota não se convenceu, e
decidiu provocá-la.
— Sou aquela digna de amor.
Amy acessou uma memória muito
antiga de quando ainda era menina e sua mãe lia histórias antes de dormir. Em
uma delas, um indivíduo de origem simples confrontava um dragão em um jogo de
enigmas, o que despertou seu interesse e permitiu que ele escapasse de sua cova
com vida. Se pudesse colocar tal habilidade em prática, quem sabe assim
conseguisse enganar a própria morte?
“Continue”, ordenou Giratina.
— Sou banhada em verde, e
conquistei o Coração de Ouro.
“Seus títulos têm a minha
atenção”, disse a serpente cada vez mais interessada. “E de onde você vem?”.
— Da terra onde tudo se
originou.
“E você sente saudade de seu
lar?”.
— Sinto.
“E por que se esgueira em minha
casa como um ladrão em busca de algum tesouro perdido? O que tenho a lhe
oferecer, senão dor e perda?”.
Amy precisou pensar rápido.
Não podia dizer que entrara ali por acidente, ou tudo pareceria coincidência
demais. Precisava prender a atenção de Giratina, e quem sabe levá-lo a cumprir
com o que queria.
— O que você tem não se
encontra em nenhum lugar do meu mundo.
“Isto é uma charada?”, ponderou
a serpente, sentindo-se desafiada. Giratina flutuou por algum tempo
contemplando os arredores e pensando no que possuía e que não existia em nenhum
outro lugar. Com certeza não seriam pedras, mas estava de mal humor e não
queria ficar de piadinhas com seu visitante, por isso respondeu: “Uma alma”.
Amy prendou a respiração. O
que diria agora?
“Eu sei quem você busca. Ele
está aqui, esperando-a a muito tempo”, disse Giratina. “Você deseja mesmo
encontrá-lo?”
— N-não... — Amy vacilou em
um segundo de fraqueza. Não podia pensar nele. Não podia demonstrar fraqueza
para que a serpente entrasse em sua mente e fizesse o que bem entendesse com
ela.
Mas era tarde demais. Amy
viu-se de frente a um espelho, mas em sua frente havia uma garotinha de apenas
dez anos. Enxergou a si mesma quando saiu em sua primeira aventura Pokémon, uma
criança assustada sem os pais, cujo coração era repleto de apatia e
insegurança.
Atrás da menina veio um homem
vestido de terno. A criança pediu colo, mas o homem não a enxergou. Amy continuou
a seguir o espelho, cada vez mais imersa naquela lembrança tão dolorosa.
— P-pai? — ela repetiu.
Giovanni olhou em sua
direção, como se pudesse escutá-la, mas sem vê-la. Ele parecia preso dentro
daquele mundo, uma alma que não se dera conta de que havia partido. Amy fechou
os punhos e sentiu raiva. Não queria lembrar-se dele. Não precisava dele. Agora
era uma mulher crescida, tinha a própria vida e quem a amasse do jeito que ela
era. Ele nunca estivera ao seu lado quando precisou. Não seria levada a pensar
que poderia fazer algo para remediar aquela ausência.
“O que você diria ao seu pai
se pudesse encontrá-lo outra vez?”, Amy escutou a voz da serpente a incitá-la.
Ela encarou seu reflexo e
pensou pelo que pareceu uma eternidade.
— Eu não preciso de você.
“Sssssim.”
— Quando eu finalmente achei
que tinha fugido de você, eu nunca mais quis encontrá-lo. Mas você continuava
sendo o meu pai. Você mentiu para mim a vida toda, e depois omitiu algo que eu
precisava saber. Você queria que eu tivesse nascido homem para substituí-lo um
dia, mas pelo visto vim com defeito por ser mulher. Você me odiou simplesmente
por eu vir ao mundo como sou.
“Sssssim.”
— Mesmo assim, você ainda me
assombra nos meus sonhos, como se implorasse por perdão. Sua partida se deu cheia
de mágoas e arrependimento. Você se foi cedo demais, e nunca tive a chance de
lhe dizer isso.
“O quê, Amy? O quê você diria a ele?”
Com lágrimas nos olhos, a
garota encarou a criança no lado oposto ao espelho. A menina apertou com mais
força um Bulbasaur de pelúcia que carregava nos braços. Amy libertou todo
aquele misto de sentimentos que vinha acumulando ao longo dos anos, e com a voz
embriagada, enfim admitiu:
— Eu te perdoo, pai. Por ter
me deixado para seguir com sua vida. Pode não ter sido a coisa certa, mas sei
que foi da única forma que sabia fazer. Nós dois somos egoístas, e isso herdei
de você. Mas também herdei a vontade de vencer, de chegar ao topo do mundo e
ter a certeza de que todos os dias fiz o que pude. Um dia eu me tornarei você
também, mas quero que saiba que serei uma versão melhor, muito melhor.
Amy limpou uma lágrima
solitária que escorria pelo seu rosto e olhou para trás.
Giratina a observava quieto,
quase relutante. Gostava de colocar humanos frente a frente com seus piores
medos, mas detestava vê-los vencendo. Banhava-se no caos, e seu alimento era a
desesperança, a raiva e o ódio.
A serpente voltou a
encolher-se e retornou devagar para dentro das sombras de onde saíra, enrolada
como um feto, muda e enfraquecida. A brincadeira havia perdido toda a graça.
O espelho rompeu-se em mil
pedacinhos e Amy viu-se liberta daquele mundo, e também de todos os medos da
responsabilidade que um dia a assombraram. Ela fechou os olhos, e sentiu-se em
paz consigo mesma.