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The Post-Game 4

 

Era a primeira vez que Amy viajava até Sinnoh, e em outros tempos gostaria de ter feito isso para desfrutar das paisagens, visitar os resorts com vista para o mar e ostentar nos cassinos e hotéis mais luxuosos da região. Precisou se controlar, pois hoje estaria ali a trabalho.

Estava esperando que fizesse frio para comer um delicioso fondue de chocolate em Snowpoint antes de voltar, mas ninguém lhe dissera que o verão em Sinnoh fazia tanto calor. Seus longos cabelos balançavam ao toque do vento, e ao invés de optar por uma infiltração sigilosa, fez questão de garantir uma passagem em um cruzeiro que logo iria atracar na Battle Zone na ilha a nordeste de Sinnoh.

Com seu chapéu verde camuflado, óculos de sol e blusão largo por cima do vestido, a intenção era justamente passar despercebida e conseguir estudar o paradeiro dos remanescentes dos Rockets antes que mais alguém soubesse que estavam retomando as atividades. Sentia-se responsável pelos atos daqueles imbecis desde que assumira o controle da facção após a morte de seu pai, Giovanni, havia tantos anos. Apesar da clara ordem de suspender toda e qualquer atividade ilegal, havia quem não compactuasse com seus planos e não considerasse a liderança de Amanda Green eficaz. Mas Amy não era tão complacente quanto seu pai com quem não obedecia suas ordens.

E falando em ordens, havia um namorado carente a esperando em Johto que ansiava por qualquer sinal de vida desde sua partida.

— Ei. Desculpinha por sair sem avisar no meio da madrugada. Ainda sou horrível com despedidas — disse Amy enquanto fazia uma chamada de vídeo através de seu PokéGear.

Não esquenta. Já te conheço bem. Amanda Green sempre faz o que quer”, disse a voz de Ethan do outro lado. Ele vestia um avental de margaridas com uma espátula na mão e um extintor de incêndio na outra. Seu Typhlosion vistoriava tudo da sala, só por precaução.

— Eu percebi mesmo que minha mochila estava pronta. E você até se deu ao trabalho de preparar uma marmitinha para a viagem, que fofo da sua parte. Fala sério, eu tenho ou não tenho o melhor namorado do mundo?

Ethan corou do outro lado da linha com o elogio, mas estava focado demais em fazer a panela de pressão não explodir.

— Tá se alimentando direito? Eu não quero voltar pra casa e encontrar um corpo desnutrido e desidratado na cama porque você não sabe fritar um ovo direito.

Eu sei fazer pão na chapa. Por sinal, estou fazendo isso agor-- AI, MEU DEDO!”

— Amor, estou começando a pensar em abortar essa missão... Quer que eu volte pra casa?

De forma alguma! Você precisa ir resolver os problemas que os Rockets continuam causando. Nós ficamos devendo isso pro Proton e a filha dele.”

— Tô só brincando. Eu não ia voltar mesmo — disse Amy com uma risada.

A treinadora encarou a imagenzinha em seu celular por algum tempo, rindo da maneira como Ethan tentava dar o seu melhor em se virar e cuidar da casa durante a ausência da namorada. Amy jamais diria aquilo em voz alta, mas poderia ficar observando-o de longe o dia inteiro, e até encontrava certo charme nele ser um palerma que se esforçava tanto para fazer as coisas darem certo. Tudo por ela.

O que está pensando em fazer amanhã além de ser um fracasso? — indagou Amy.

Muito engraçado. Não piore minha autoestima”, disse Ethan com sarcasmo. “É difícil ficar sem você... Eu preciso fazer alguma coisa, estou ficando doido!”

— Você já explorou cada canto de Johto, o que tem para de descobrir? Céus, New Bark parece mesmo um vilarejo do interior depois que viajamos até outros continentes, aí só tem caipira!

Poxa, não fala mal da terrinha...”

— Tá bem, tá bem. Eu amo New Bark. Posso ter nascido em Kanto, mas meu coração está em Johto, porque você está aí — Amy começou a tagarelar enquanto ia mostrando a paisagem do navio. — Ei. Eu estava lembrando aquela vez que você me beijou no Lago da Fúria... ou melhor, eu estava desacordada. Nós dois sabemos que você só se aproveitou de uma dama indefesa e fez o que bem entendeu.

E-era uma respiração boca a boca, tá legal? Ouch! Calma aí que tropecei no Sand estirado no tapete.”

— Acho melhor eu voltar pra casa antes que você e o Tai coloquem fogo em tudo. Quer apostar que termino o serviço até o fim de semana? — Amy olhou para o mar e ajeitou uma mecha no cabelo. — Mesmo que esteja fazendo calor, os ventos que sopram aqui são bem gélidos, parece até a Jynx tentando me matar congelada de novo. Ah... E quando tivermos a chance, quero voltar com você.

Eu vou adorar. E sabe que você está bem sexy vestida assim? Estou doido para te encontrar e arrancar peça por peça de você.”

Eu quebro seu nariz — disse Amy com uma risada calorosa. — Vou desligar agora porque já estamos quase na costa. Se cuida, seu boçal. Te amo. Beijo-beijo.

 

Dava para enxergar a gigantesca Battle Tower muito longe na costa, erguendo-se majestosa em meio ao mar infindo como um pináculo de poder. A Fight Area recebia inúmeros treinadores estrangeiros que se preparavam para o desafio dos cem andares, mas Amy tinha outro objetivo. O primeiro passo era investigar e descobrir qualquer avanço suspeito na região nos últimos meses sem levantar suspeitas da polícia.

— Vamos começar estudando o cenário. Pidgeot, é hora da carona.

Amy lançou a pokébola de seu Pokémon pássaro que se materializou e esticou as asas para demonstrar inquietação. Sua Pidgeot era uma das maiores já registradas, capaz de carregar até três treinadores em suas costas e atravessar um continente. As penas do Pokémon reluziam ao sol, com a crina multicolorida brilhando como um arco-íris.

Amy subiu em suas costas e sobrevoou a região, encantada com o quão bela Sinnoh era. O Monte Coronet erguia-se no centro por onde uma nuvem densa pairava, mais ao norte podia ver focos de neve em Snowpoint e ao sul toda a beleza das praias maravilhosas de Sunyshore.

O vento soprava forte e o sol esquentava a cabeça. A Pidgeot praticamente planava sobre as nuvens, sempre rumando ao norte. Ela tinha tamanho domínio do céu que sua treinadora podia se dar ao luxo de estudar a topografia da região e fazer possíveis anotações em um caderno sem se preocupar em dirigi-la.

Tudo seguia na mais perfeita calma quando Amy escutou o som de sirenes. Segurou o chapéu e olhou para trás, notando que havia uma pequena cabine automática com hélices barulhentas que mais se parecia com um mini-helicóptero aproximando-se. Ela revirou os olhos e aguardou. Quando a cabine foi aberta havia um homem uniformizado ali dentro, vestindo óculos escuros e chapéu da Guarda Florestal. Empoleirado em seu ombro havia um Chatot de olhos esbugalhados e bico torto. O policial retirou os óculos e balançou a cabeça lentamente.

— Bonito, hein.

— Escuta, Seu Policial, eu nem estava acima da velocidade, todos os meus documentos estão em ordem, pode verificar. Sou nova na região, então me perdoe se eu estiver infringindo alguma lei que eu desconheça, e--

Amy começou a inventar tantas desculpas que o próprio policial ergueu a mão e pediu que ela parasse.

— Fica tranquila, moça. Só estou falando que esse seu Pidgeot aí... é mesmo uma nAve, sacou? Esse é o maior que eu já vi em toda minha vida. Precisei até parar pra perguntar — disse o homem em tom de surpresa. — Primeira Geração?

— Ah, você gostou? É sim, uma Kantoniana clássica, 6 IVs e focada em velocidade. Foi um dos meus primeiros Pokémon da vida. Cuido dela desde garotinha.

— Eu sou fissurado em Pokémon voadores. Quando menino até me inscrevi para me tornar líder de ginásio do tipo aqui na região, mas não consegui passar da segunda fase. Vou te contar, eu tenho um Staraptor, Quarta Geração, 3 IVs que já é uma mão na roda, mas ele não chega aos pés dessa belezinha aqui.

— Ela é linda mesmo, não é? — disse Amy enquanto afagava as penas de seu estimado Pokémon e falava com a voz mais fina. — Quem é a diva da mamãe, hein? Quem é?

Mamãe-mamãe! Kraaaaw! — repetiu Chatot.

Amy olhou feio em direção do Chatot que até se encolheu no ombro de seu dono.

— Então a senhorita vem de Kanto — ponderou o policial com a prancheta em mãos, em pleno voo. — O que veio fazer por essas terras gélidas bem durante o verão? Pretende participar da Battle Tower com essa superpotência?

— Ah, só estou atrás de algumas experiências novas. Sabe de algum bom lugar pra treinar?

— Sim, eu recomendaria a Stark Mountain em outros tempos, mas no momento a área está com acesso bloqueado. Ouvi dizer que a Polícia Internacional foi acionada, eles farão uma operação até o anoitecer, acredita?

— Jura? — Amy se fez de desentendida. — Ah, então é melhor eu ficar longe mesmo! Imagine só se eu acabo trombando com algum desses ladrões de Pokémon? Eu iria detestar que levassem minha pobre Pidgeot!

— Isso seria uma tragédia! — espantou-se o policial. — Nunca se sabe quando um ladrão pode estar disfarçado bem na nossa frente, né? Enfim, vou ter que pedir que tome cuidado ao sobrevoar essa área. A fumaça do vulcão pode ofuscar seu campo de visão, mesmo para um foguete experiente como sua Pidgeot.

— Pode deixar, Seu Policial!

Mamãe-mamãe! — gritou o Chatot em despedida, e só pelo olhar Amy deixou bem claro que se aquele papagaio dissesse mais alguma coisa ela o ensinaria uma palavrinha nova que iria bani-lo de todas as competições globais por uma década.

 

Assim que o policial deu as costas com seu veículo motorizado barulhento, Amy deu um rasante com sua Pidgeot que mergulhou tão depressa abaixo das nuvens que ninguém pôde enxergá-la. Por obra do acaso ou descuido das autoridades, ela agora sabia que a P.I. estava com uma operação não-tão-secreta marcada na famigerada Stark Mountain. Sua investigação começaria por ali.

Ela desceu nas proximidades da floresta, preferindo buscar alguma passagem na base da montanha. Por se tratar de um local tão famoso era de se esperar que houvesse mais treinadores na região, mas no momento não havia ninguém.

Ao descer da Pidgeot, ela esticou a mão para frente ao perceber que pequenos floquinhos pareciam pairar pelo céu. Seu chapéu já estava sujo nas bordas. Ela pegou a fuligem preta e a amassou com a ponta dos dedos.

— Cinzas vulcânicas — murmurou ela.

Para estudar o solo, lançou a pokébola de um Pokémon que vivia bem em regiões montanhas. Sorrateira, sua Sneasel, não estava nem um pouco contente por dar as caras em um lugar tão abafado e fedido que não se lembrava em nada com sua morada, mas cumpriria sua parte do trabalho e logo voltaria a descansar.

A Sneasel farejou o ar. Só podia ser enxofre, e com toda certeza a origem do cheiro a levaria ao centro do vulcão. Amy precisou se apressar para acompanhar a Sneasel que não se incomodava em olhar para trás. Sua treinadora conhecia tão bem seus Pokémon que só precisava se dar ao trabalho de dar-lhes a instrução uma única vez.

— O que encontrou, Sorrateira?

A Sneasel estava parada diante do que parecia uma zona de descarte e resíduos, com pedaços de vidro e material orgânico utilizado em pesquisa. Aquilo era um sinal mais do que óbvio de que havia atividade humana nas redondezas.

E eles não deviam estar tão distantes.

 

Em pouco mais de uma hora a Sneasel localizou uma passagem discreta nas raízes da montanha, perto do que pareciam ser termas aquecidas por vapor. Amy aproximou-se só para verificar com a pontinha do dedo a temperatura da água que estava ideal. Sentiu vontade de despir-se ali mesmo e passar algumas horas relaxando naquela banheira natural, mas já entardecia e a Polícia Internacional daria início a sua operação.

Ao adentrar a passagem, o ar começou a ficar cada vez mais quente e abafado. O local era todo iluminado por um sistema elétrico antiquado, o que indicava ao menos que alguém o vinha frequentando. Devia funcionar como uma saída de emergências, pois era um longo corredor que serpenteava cada vez mais fundo nos confins da montanha.

— Parece um laboratório velho — comentou Amy. — Isso aqui está cheirando a Rockets.

Amy não avistou uma alma viva nos poucos minutos que se infiltrou na base. Sua Sneasel caminhava à frente pronta para atacar caso necessário. A treinadora saiu investigando qualquer pista que pudesse expô-los, mas só encontrou pesquisas e livros acadêmicos. Em um dos armários havia uma série de uniformes cinza com detalhes preto estampando um logotipo em forma G que ela nunca ouvira falar.

Amy e seu Pokémon se entreolharam. Sua Sneasel estava claramente a julgando.

— Não olhe assim pra mim. Uma vez ladra, sempre ladra.

Amy vestiu o uniforme cafona e tirou um minuto para se olhar num espelho trincado no canto da sala. Deu uma bela olhada em sua traseira, preocupando-se que tudo estivesse devidamente em ordem. A roupa era um pouco cavada, com um tipo de collant apertado que ia por baixo usando botas e calças listradas.

— Por Arceus, como é que alguém em sã consciência sai na rua com um uniforme desses? Não é à toa que os Rockets ganhavam todo ano no festival de moda com o Melhor Uniforme.

No fim do corredor escutou vozes se aproximando. Os pesquisadores deviam estar começando a voltar ao serviço.

Amy esgueirou-se nas sombras com profissionalismo, pois desde pequena adquirira experiência para passar a perna mesmo nas equipes criminosas mais perigosas do mundo. Escondeu-se embaixo de uma mesa e parou para escutar. Quando olhou de relance, um rapaz e uma moça chegaram e sentaram-se em frente aos seus computadores, conversando sobre algo extremamente importante do qual Amy não compreendia.

— Star, você acha que devo arriscar?

— Não sei, Cosmo. Quantas gemas você conseguiu juntar esse mês?

— Umas 200, mas não sei se isso é o suficiente para eu conseguir a personagem que quero. São só 3% de chance, se eu gastar 155 gemas então posso ter um garantido, mas não vai sobrar nada para tentar as waifus de biquíni no fim do mês.

— Vai ter algum husbando bonitão?

— Sempre tem. Se der sorte, eu pego os dois.

Cosmo estava pronto para arriscar a sorte. Rezou para todos os deuses que conhecia e prometeu ser um capanga melhor para sua facção caso obtivesse êxito, e na décima sétima tentativa, a tela brilhou anunciando que um personagem Ultra Raro estava a caminho.

 — Glória a Arceus! — berrou Cosmo com as mãos ao alto.

Antes mesmo que pudesse comemorar a maior conquista de sua vida, sentiu as garras de uma Sneasel ao redor de seu pescoço. Do outro lado, sua companheira também havia sido imobilizada pela ladra.

— Quem são vocês? — Amy perguntou agressiva. — Para quem estão trabalhando? Que tipo de pesquisa fazem aqui? — Após um breve intervalo de interrogações, ela os pressionou: — Vocês não estão trabalhando para os Rockets, estão?

— Rockets? Claro que não. Somos Team Galactic com orgulho — respondeu Cosmo.

— Ou pelo menos o que sobrou deles — concordou Star.

— Galactic? Nunca ouvi falar — mentiu Amy. De fato não os conhecia pessoalmente, mas lembrava-se do breve relato de Proton sobre sua operação. — O que fazem debaixo dessa montanha como se estivessem atuando no sigilo?

— Nós pesquisamos Pokémon. Estamos estudando clonagem.

— Eu sabia! — afirmou Amy. — Então há de fato algum Rocket envolvido nisso.

— Nós não suportamos esses caras — contou Cosmo. — São todos um bando de egocêntricos que só visam roubar e não hesitam em ferir os outros para atingir seus métodos. Sim, temos um ou outro atuando aqui conosco. E seríamos muito gratos se pudesse dar um fim nos que restaram.

— Estamos começando a falar a mesma língua — disse Amy com interesse.

Cosmo e Star não hesitaram ao contar “quase” todos os detalhes que sabiam sobre as pesquisas do Profº Charon na Stark Mountain. Contaram sobre os eventos da Grande Criação que precedeu uma investida da polícia e os membros da Liga que liquidaram de vez a presença dos Rocket no continente. Amy, por motivos óbvios, não contou a eles que era a mandante da facção, mas também ela não tinha culpa se Archer e outros ex-executivos agiram por suas costas para reerguer os planos de Giovanni longe de Kanto.

“O Proton não tinha me explicado a história toda... parece que eles fizeram um estrago em Sinnoh também”, pensou Amy. “Me sinto responsável por isso. Está na hora de colocar um fim de uma vez por todas na Equipe Rocket e seu legado de terror.”

— Como posso encontrar os membros que sobraram? — indagou Amy.

— Um dos representantes deles está aqui. Posso guiá-la se quiser.

Cosmo a guiou através dos corredores que se dividia em inúmeras passagens, Amy atingiu a sorte das grandes por contar com aquela escolta. Quando alcançaram seu objetivo, ele fez sinal de silêncio e apontou para dentro de uma salinha escura antes de se retirar.

Amy confiava que seus Pokémon poderiam resolver qualquer problema. Sneasel estava de garras expostas, e seu Primeape pronto para nocautear quem ousasse escapar. Não sabia com qual dos ex-executivos estava lidando, e cogitou até mesmo que alguns deles tivesse voltado do mundo dos mortos para assombrá-la.

Uma moça de cabelos negros e jaleco branco estava sentada de costas para a porta, um sinal de claro desleixo tendo em vista que uma das regras primordiais dos Rockets era sempre sentar-se onde se tem visão da saída para uma eventual fuga quando necessário. De fato, a garota usava um par de fones de ouvido e balançava a cabeça alegremente, absorvida pelas anotações que fazia num papel florido com canetas coloridas.

A Sneasel tocou a ponta de sua garra nas costas dela. A garota soltou um suspiro, largou a caneta e ergueu as mãos num sinal de rendição.

— Não grite — ordenou Amy.

— Não se preocupe. Já passei por tanta coisa essa semana que estou me acostumando — respondeu Dawn, girando na cadeira bem devagar para encarar quem quer que estivesse ali.

— Você é a mandante dos Rockets por aqui? Por que está retomando as pesquisas de clonagem? — Amy a pressionou apreensiva.

— Quem, eu? — indagou Dawn, surpresa. — Não estou ajudando Rocket nenhum, estou só compartilhando meu conhecimento para ajudar.

— É o que todos cientistas dizem antes de inventar alguma engenhoca que vai colocar em risco o mundo inteiro — retrucou Amy.

— Desculpe? Que tipo de preconceito é esse para cima dos cientistas? — Dawn revidou, profundamente ofendida. — Pois saiba que nós, pesquisadores, precisamos nos arriscar para que novas descobertas possam chegar à população. Eu estou cansada desse retrato estereotipado de que o cientista é sempre o lunático, só porque mexemos com coisas que a maioria não entende. É só reparar que em toda história o arquétipo do cientista é usado como um disfarce para um vilão nessa eterna busca por conhecimento, visando despertar uma entidade adormecida ou quem sabe até--

Amy cansou-se daquela conversa e ordenou que sua Sneasel nocauteasse a garota com um golpe na nuca. Dawn apagou na mesma hora, caindo no chão desacordada. Se ela fosse mesmo a responsável pela ascensão dos Rockets em Sinnoh, precisaria de seus contatos e influência para entender o que eles estavam planejando.

— Você fala demais, garota — murmurou Amy impaciente, tentando carregá-la.

Quando estava para deixar a sala de pesquisas, a saída havia sido bloqueada. Em frente à porta havia uma mulher de cabelos vermelhos, olheiras e o velho uniforme dos Galactic com seu emblema estampado no peito. Ela estava magra e fraca, mas havia uma ferocidade no olhar que apontava que era melhor não mexerem com ela.

— Eu não sei quem você é, mas é melhor não interromper nossos planos — disse a Comandante Mars.

— Você não vai querer arrumar encrenca comigo — respondeu Amy.

A primeira investida veio por parte de Mars que arremessou sua pokébola que liberou uma Purugly balofa, tão resistente quanto um tanque. Do lado de Amy seu Primeape entrou no ringue pronto para esmurrar.

Close Combat! — ordenou a treinadora.

O Pokémon primata esmurrou a Purugly que tentava aguentar firme mesmo em clara desvantagem. Quanto mais o Primeape se irritava, mais poderoso ele se tornava. Saltitava de um lado para o outro dando jabs e socos direto no felino que se concentrava em defender até que chegassem reforços. Amy não poderia perder tempo com aquela baboseira, ou acabaria ficando encurralada.

— Não vou permitir que você leve essa menina. Ela é da família — contou Mars.

— Sei bem como é. Sempre protegemos os nossos — respondeu Amy, confiante. — E como a representante legal por todas as merdas que os Rockets continuam causando, eu preciso acabar logo com isso.

O Primeape finalizou seu oponente com um cruzado que fez o Purugly ver estrelas. Mars não estava em condições físicas ou psicológicas de vencer uma batalha. Dawn começou a se mexer ainda atordoada pela concussão, mas agora dava sinais de recobrar sua consciência.

— Tia... Martha...? O que você está... fazendo?

— Martha? Você só pode estar de brincadeira — indagou Amy, encarando a Comandante Mars. — Nós não vamos parar essa luta só porque alguém disse “Salve a Martha”, ou vamos?

A Comandante retornou seu Pokémon, mas ponderou com cuidado sobre suas palavras. Tentou interligar os fatos, e só conseguiu chegar a uma conclusão.

— Foi o meu marido que a mandou aqui, não foi? — indagou Mars.

— Se você for a esposa de um cara charmoso que atende pelo codinome Proton, então sim.

— Quero que diga a ele para não tentar mais me impedir — vociferou Mars com irritação. — Eu já tomei a minha decisão! Vou trazer o nosso filho de volta, mesmo que isso custe a minha vida. E-eu preciso fazer isso... por ele...

— Ei, ei. Vai com calma — falou Amy, procurando uma abordagem mais amena. — Eu não vim aqui para julgá-la. Vim por dois motivos: primeiro, limpar a sujeira dos outros antes que sobre para mim; e segundo, você tem uma filhinha linda te esperando em casa. Não abra mão do seu mundo inteiro só porque perdeu parte dele.

A expressão de Mars mudou da água para o vinho. Em seu olhar havia o semblante de uma mulher doce que descobrira a maternidade havia pouco tempo, mas também manchada pelas cicatrizes e doses que vinham no conjunto. Mars amava Eletra, sua filha mais velha, e queria vê-la crescer e quem sabe um dia tocar sua própria facção criminosa. Tal ideia a fez rir com os olhos marejados. Por um instante sentiu-se muito egoísta em abrir mão dela e do marido que tanto a amava.

— O que eles disseram sobre mim...? — indagou Mars.

— Os dois só querem que você volte para casa. Eles precisam de você como mãe e esposa — respondeu Amy.

— Mas como eu poderia encará-los ao voltar de mãos abanando?

Amy desviou o olhar, buscando fundo em seu próprio coração para dizer aquelas palavras:

— Eu cresci sem pai. É difícil ser cuidado por um lado só, a balança sempre acaba pendendo. Ele vivia procurando uma forma de voltar para casa e trazer alguma coisa para mim para compensar, fosse um presente que ele achava que eu queria ou rios de dinheiro. Às vezes ele só queria manter as contas pagas. Mas ele nunca percebeu que o que eu mais precisava era ter um pai presente em casa. Eu teria pago para ele pra ficar, se fosse rica como ele era. Eu teria comprado todo o tempo do mundo ao lado dele...

— Mas tempo não se compra. E disso Dialga sabe muito bem — respondeu Mars de maneira mansa.

Quando as duas finalmente estavam começando a se entender, o alarme do laboratório disparou com seu som ensurdecedor. “Alerta vermelho! Alerta vermelho! Intruso detectado!”.

— Parece que fui descoberta. — Amy deu de ombros, fingindo surpresa. — Até que demoraram.

— Não foi você — contou Mars. — Tem mais alguém aqui.

A Comandante saiu às pressas, pois não queria que ninguém soubesse que ela compactuava com os planos do Team Galactic e aquilo voltasse a colocar a segurança de sua família em risco. Amy agachou para verificar as condições de Dawn, mas a garota ainda estava desnorteada e não conseguiria andar, o que dificultaria sua fuga.

Amy olhou para o fim do corredor esfumaçado, iluminado por luzes vermelhas oscilantes conforme o alarme gritava. Sacou uma pokébola da bolsa e aguardou o confronto.

Do outro lado do corredor, duas sombras se ergueram como se envolvidas por uma dança. Um majestoso Dusknoir adentrou o local de braços cruzados ao lado de uma Froslass que fazia sua entrada triunfal como sua primeira dama. Conforme avançavam, o chão por onde os Pokémon fantasma flutuavam congelava assim como as paredes ao redor, transformando o corredor espremido em um caixão de gelo dentro de um vulcão adormecido.

Atrás deles veio um garoto ordinário, sempre de cabeça e queixo erguido com sua boina púrpura, jaqueta azul e seu clássico cachecol branco. O gelo controlara a temperatura de tal forma que ele nem precisou se dar ao trabalho de trocar de roupa, como se a própria natureza tivesse de se curvar perante sua vontade.

— Opa. Foi mal por atrapalhar seus planos. Só sei entrar pela porta da frente — disse Luke Wallers.

O que mais o surpreendia era que alguém ainda tivesse coragem e ousadia o bastante para combatê-lo. Os anos podiam tê-lo tornado mais humilde e contido, mas ainda havia traços da soberba de alguém que se consagrou campeão em sua juventude. Luke não se deu ao trabalho de pensar demais e ligar os fatos. Ali estava uma mulher desconhecida com o uniforme da extinta facção dos Galactic, pronta para enfrentá-lo. Ao seu lado, o corpo estirado da garota por quem cruzaria um continente para salvar.

Luke e Amy se encararam sem dizer palavra alguma. No cinto da calça, uma Dusk Ball estava à mostra como se fosse sua principal arma, seu dedo indicador pousando a poucos centímetros do gatilho.

— Solta a garota — ordenou Luke.

Mas Amy não gostava de receber ordens. Ela sorriu com afronta.

— Vem me obrigar.

A Dusk Ball zuniu. Um flash dominou o corredor antes que tudo mergulhasse num breu, como se tivesse roubado a própria escuridão. Por entre a fumaça e luzes oscilantes da sirene, um par de olhos amarelos surgiu e deu espaço a um enorme dragão bípede com suas lâminas no lugar de garras prontas para dilacerar. O Garchomp vociferou como forma de intimidação e aguardou as ordens ao lado de seu mestre.


The Post-Game 3

Dawn despertou em um local quente e abafado que não lhe lembrava em nada o aconchego de seu quarto na Resort Area. Àquela hora da manhã estava acostumada a se deparar com Cynthia andando pela casa vestindo apenas seu roupão de veludo cor de vinho, segurando um copo de café na mão e esbanjando toda sua sensualidade como quem tem plena consciência de que é a mulher mais sexy do mundo.

A garota sentou-se ao pé da cama e olhou ao redor, procurando situar-se. Os lençóis brancos haviam sido substituídos por um trapo velho e encardido, e o rizzotto feito na janta de noite passada fora trocado por um copo de água morna e papéis em branco na escrivaninha ao lado.

Sua cabeça latejava, como se tivesse dormido por tempo demais após uma madrugada de festa onde ninguém se divertiu. Quis saber que horas eram, mas nenhum feixe de luz entrava, pois não havia janelas no aposento.

Aos poucos a memória do sequestro lhe veio à tona, o olfato ainda afetado lhe dava náuseas. Sentiu-se como um Rattata de laboratório prestes a sofrer experimentos bizarros.

A porta abriu rangendo, e dela veio uma garota de cabelos esverdeados com uma Glameow ao seu lado carregando uma bandeja de comida.

— Bom dia — cumprimentou a moça.

— Err... oi — murmurou Dawn.

— Este é o seu almoço. Por favor, sirva-se — ofereceu ela. O prato de comida continha um pouco de arroz, feijão, ervilhas e metade de um bife, mas parecia apetitoso. — Espero que esteja recuperada. O Professor Charon a aguarda em sua sala para a reunião dentro de vinte minutos.

Dawn vestiu as roupas limpas deixadas no armário, um uniforme cinza listrado que lhe pareceu estranhamente familiar, mas não soube vasculhar suas memórias para descobrir de onde era. Como não havia alternativa, decidiu dirigir-se para a reunião com o tal professor. A princípio imaginou que fosse algum tipo de prisioneira, mas não havia grades nas portas nem vigilantes na entrada, ela tinha o direito de ir e vir aonde quisesse, só precisava descobrir onde estava, pois a temperatura tão elevada não era habitual de Sinnoh.

A moça seguiu pelos corredores cavernosos do esconderijo até seu senso de descoberta a levar a querer ir além. Ao alcançar a sala principal do que parecia ser um laboratório de baixo orçamento, Dawn se deparou com um velho calvo de costas encurvadas que examinava um tubo de erlenmeyer ao lado de outros dois pesquisadores com seus Pokémon, uma Glameow e um Stunky. Dawn bateu à porta que já estava aberta e pediu licença.

— Oh, você acordou — disse o velho. — Finalmente. Rápido, rápido, preciso que sua cabeça seja colocada para funcionar o quanto antes.

— Será que vocês poderiam me explicar primeiro o que estou fazendo aqui? — perguntou a garota.

— Claro. Antes de mais nada, sua namorada e filha adotiva passam bem. São elas que devem estar preocupadas com você, afinal, nós a sequestramos — o velho ajeitou os óculos, falando como se aquilo fosse parte de sua rotina. — Por que essa cara? Você já deve estar acostumada a ser a garota indefesa do grupo. Li tudo nos seus arquivos. Dawn Manson. Vinte e dois anos. Natural de Sandgem, mas viveu grande parte da infância na Ilha de Dewford ao lado dos pais. Ocupação: pesquisadora. Tipo sanguíneo O...

— Como você sabe tudo isso?

— Eu acessei aqui nesse blog. Enfim, por que não poupamos as apresentações e vamos direto ao assunto?

— Vai me dizer que não está acostumada a falar com estranhos? — perguntou um dos pesquisadores. Ao seu lado o Stunky também vestia um jaleco e parecia todo chique. — Pensei que fôssemos velhos conhecidos seus.

— Ela não deve ter nos reconhecido, Cosmo. Já faz uns booooons anos, deve ter sido a nossa única participação nessa história.

O velho estendeu os braços para seu laboratório caindo aos pedaços, como se quisesse realçar toda a grandiosidade do seu buraco escuro e desagradável.

— Isso é o que restou da Team Galactic! Eu sou o Professor Charon, cientista chefe do setor de clonagem e responsável geral pelo que sobrou dessa geringonça. Seja bem vinda ao seu novo ambiente de trabalho, estagiária.

A garota revirou os olhos. Galactics outra vez, e assim sucessivamente rumo ao infinito.

— Eu mereço... Por que vocês vilões não tentam algo diferente pra variar de vez em quando? Aposto que estão tentando conquistar o mundo. É sempre a mesma coisa!

— Conquistar e transformar são coisas completamente diferentes — pigarreou Charon. — Por favor, entenda. Querer mudar o mundo é estar destinado ao fracasso, devemos compreender como ele funciona e nos adaptarmos para sobreviver nele. Os que restaram de nossa equipe estão aqui reunidos por um único objetivo, e não se engane: o final a fará te enxergar o mundo em que vivemos de outra forma.

Dawn levou um susto quando um Pokémon saltou de dentro da tela de um computador tão velho quanto o fóssil de um Shieldon. Seu corpo era alaranjado e feito de plasma, disparando para todos os cantos da sala e causando curtos-circuitos, oscilando lâmpadas com o poder de sua eletricidade.

— Ah, Rotom, meu velho amigo — disse Charon com a voz cansada. — Por que não mostra para nossa visitante todas as pesquisas em que estivemos trabalhando?

Bzzzzt! Bzzzzt! É pra já!

O corpo do Pokémon assumiu o formato de um pendrive que ingressou dentro do CPU velho do computador, baixando centenas de pastas que pipocavam na tela do sistema que mal suportava a descarga de arquivos. Dawn aproximou-se da mesa para observar do que se tratava e precisou ler apenas o título para descobrir.

— “Clonagem?”. “Fendas?”. O que significa tudo isso?

— A ponta do iceberg — respondeu Charon. — Os Rockets já vêm trabalhando nisso há muito tempo, e reunindo os arquivos perdidos da misteriosa Ilha Pokémon que você adquiriu, parece que podemos continuar progredindo e aperfeiçoar algumas etapas.

— Há anos os cientistas brincam de dar vida, e toda vez isso trouxe catástrofes inimagináveis. O naufrágio das Ilhas Laranja, a explosão da Ilha de Ferro em Sinnoh... — Dawn listou só para começar. — Parece que vocês estão para repetir os mesmos erros.

— Não se preocupe, não queremos nada tão grandioso quanto aquele idiota do Cyrus — respondeu Charon.

Dawn revelou um sorriso cínico.

— Engraçado ouvir um dos empregados dos Galactics chamarem seu próprio chefe dessa forma.

Nunca entendi o que eles viam nele — disse o professor com um suspiro —, nada além de um homem patético e imaturo que se sufocou na própria ideia. Ele teve todo o árduo trabalho de fundar e erguer os Galactic, e para o quê? Em última análise, ele destruiu sua própria criação. E agora só me sobraram tralhas e restos para trabalhar.

— O que houve com os outros comandantes? — perguntou Dawn.

Comandante Jupiter e Saturn nos desertaram — comentou a dona do Glameow.

Tão insensato da parte deles! — Charon falou com a voz alterada, seu semblante tornando-se mais sombrio. — Tolos, todos eles! Jogando fora todo o esforço que tivemos para nos erguer...

— E quais resultados vocês esperam obter? Pelo visto vocês estão sozinhos, e é questão de tempo até que a Polícia Internacional os encontre e um exército venha me resgatar — Dawn o desafiou, confiante de sua importância. Há muito tempo deixara de ser a garota insegura que se aventurara por Sinnoh.

Charon precisou sentar-se na cadeira de seu escritório. Seus dedos tamborilavam na mesa enquanto ele contemplava uma moldura inerte.

— Você já perdeu alguém que amava, Srta. Manson? — perguntou o cientista.

Dawn sentiu uma pontada de desconforto com a frase. Pensou em seus pais, memórias remotas da família que perdera em uma tempestade em Hoenn há mais de uma década, nos amigos com quem compartilhara uma fase difícil quando menina, e até mesmo em seu velho Aggron que falecera recentemente.

— E quem não perdeu? — ela respondeu com um sorriso franco.

Charon aproximou-se dela como uma serpente ardilosa e sussurrou em seu ouvido:

— E se pudesse trazê-los de volta?

— É impossível. — Dawn afastou-se depressa. — E qualquer que seja a forma que esteja tentando fazer, é proibido. Este dom só pertence às divindades.

— Oh, mas Arceus vive ocupado. Ele não estará olhando se fizermos tudo direitinho — disse Charon, estendendo a mão para seus assistentes. — Você nem se lembra desses dois.

— Não mesmo.

O Rotom saltou da tela do computador, emitindo um ruído atípico.

“...capítulo quatro...bzzt...”

 — Cosmo e Star foram os dois recrutas responsáveis por roubarem as PokéAgenda do laboratório do Profº Rowan, e obtiveram sucesso em escapar com uma delas. Nos últimos anos estive ocupado tentando burlar o software desse apetrecho e, tenho de admitir, o velho Rowan e seus assistentes são bons nisso — disse Charon, revelando os pedaços de um velho aparelho que fora deixado sob a mesa, tornando-se irreconhecível.

— Você esperou todo esse tempo só para usar as informações contidas em uma PokéAgenda? — Dawn perguntou. — Está tudo na internet hoje em dia. Informação ágil e de fácil acesso a todos.

— Eu sei. E justamente por isso não precisei me dar ao trabalho de sair por aí coletando dados. Vocês fizeram isso por mim.

O Profº Charon a convidou a visitar uma sala no final do corredor. O ambiente era mal iluminado e emitia uma energia estranha. Dawn caminhava cautelosa. Havia imensos tubos com um líquido esverdeado dentro e ela precisou conter um grito ao perceber que havia Pokémon das mais variadas espécies mergulhadas ali, tendo alguns outros sido empalhados como objeto de estudo. Charon seguia com as mãos para trás enquanto falava com a voz tranquila:

— Como cientistas somos todos curiosos por nascença, minha pequena. Lembra-se de um caso famoso há alguns anos onde um médico salvou a vida de sua paciente, e foi processado por deixar uma cicatriz nela? — murmurou Charon. — Cosmo, Star. Por que não vêm até aqui e mostram para nossa amiga como vocês se dão bem com seus novos Pokémon?

Dawn preciso conter o espanto ao notar que naquele laboratório amaldiçoado os Pokémon eram usados como experimento. Os capangas dos Galactic nem pareciam sentir remorso do que fizeram, estavam muito contentes em oferecer seus companheiros de longa data como objetos de tudo.

— Vocês os transformaram em cobaias! — Dawn indignou-se.

— Mas eles ainda estão aqui conosco — respondeu Cosmo. — Veja, a clonagem foi um sucesso! Exceto por algumas pequenas sequelas, claro.

— Ficamos muito felizes em colaborar com as pesquisas do Profº Charon. Ele tem tanto potencial — respondeu Star.

— Afinal, sua tese do TCC também se baseia em DNA Pokémon, não é mesmo, Srta. Manson? — indagou Charon. — Ora, não banque a hipócrita. Sabemos que você esteve investigando a capacidade do Mew de se transformar. E toda essa história de clonagem está muito atrelada ao que vocês vivenciaram com um dos maiores experimentos feitos pela extinta Equipe Rocket, a Grande Criação.

Dawn recuou devagar. Ainda não compreendia as intenções daquele lunático, mas um frio percorreu sua espinha, o prenúncio de que algo terrível estava para acontecer ali.

Sentiu alguém segurar suas costas por trás e reconheceu o toque de Petrel, um dos ex-executivos dos Rockets que ajudara em seu sequestro. O homem conteve os braços dela com violência ao primeiro sinal que ela demonstrou de reagir.

— Por favor, por favor, estamos aqui para trabalharmos juntos e unirmos nossas mentes! — falou Charon. — Srta. Dawn, você não reconhece que foi uma das únicas a presenciar eventos marcantes de nossa história como a batalha do Spear Pillar e a explosão da Ilha de Ferro? Você se subestima. Pode até ser passível de todos esses acasos, mas você esteve ali, observando, analisando... você é a minha PokéAgenda ambulante. Por que roubar uma caixa de aparelhos velhos quando posso ir direto para a fonte?

Charon caminhou devagar em direção da garota e tocou seu rosto de leve.

— Com uma mente como a sua, eu teria feito o mundo se ajoelhar aos meus pés.

— Não cairei em sua lábia — Dawn retrucou furiosa. — Eu me recuso a ajudar alguém como você, que faz humanos e Pokémon vítimas diante de promessas sem fundamento.

Dawn virou-se ao escutar alguém tossindo no recinto. Uma mulher de cabelos vermelhos os vinha observando das sombras. A antes bela e vaidosa Comandante Mars agora vestia um uniforme gasto, tinha olheiras profundas e os cabelos mais longos e sem corte. Uma de suas mãos repousava sobre sua barriga, como se estivesse sentindo dores intermináveis na região. Dawn conhecera a tia Martha nos tempos em que ainda se aventurara com os Irmãos Wallers, mas nunca teria imaginado que ela estaria colaborando outra vez com os planos dos Galactics.

— Por favor, não pense que sou sua inimiga — rogou Mars. — Eu estou aqui porque Charon prometeu me ajudar, e com sua chegada, pela primeira vez sinto um pouco de esperança.

Charon permitiu que as duas tivessem um momento para conversarem a sós em sua sala. Mars sentou-se com dificuldade, recebendo ajuda para se sentar. Ela estava magra e enfraquecida. Dawn ainda se lembrava dela como a mulher sorridente que presenteava seus sobrinhos com TMs falsificados e fazia entradas triunfais em seu balão com o formato de um Drifblim.

— Espero que não sinta raiva de mim depois de tudo que aconteceu — explicou Mars, referindo-se ao incidente no Spear Pillar.

— Tá tudo bem — Dawn fez um sinal para que ela esquecesse tudo aquilo. — Você é prisioneira deles?

— Não. Sou voluntária — Mars respondeu com a voz sucinta.

— Voluntária? Então você está se oferecendo para--

A comandante não respondeu à questão. Seu olhar era disperso e sem emoção.

— Eu já não me importo com o que aconteça comigo. Não sei se chegou até seus ouvidos, mas... eu perdi um filho faz algum tempo.

Dawn ficou chocada com a notícia. Era estranho ouvir aquela declaração de alguém que considerara um inimigo por tantos anos e, de repente, sentir empatia por ela. Não pediu por detalhes, mas sentiu que deveria consolá-la de alguma maneira.

Com um toque delicado, sua mão encostou-se à dela, como se de alguma forma aquilo pudesse transmitir um pouco de conforto.

— Eu consigo imaginar a sensação de perder uma criança — respondeu Dawn. Desde que começara a viver com Cynthia, a segurança e felicidade de Verity eram sua prioridade.

— Às vezes parece que estou sendo egoísta por abrir mão da minha família por conta de uma criança, mas... a dor foi tamanha nesse último ano que mal tenho encontrado forças para continuar seguindo em frente — disse Mars com a voz entristecida. — Se o Profº Charon souber alguma maneira de trazer meu filho de volta, eu estou disposta a fazer tudo por ele.

— Eu não sei nem metade de tudo que você passou nos últimos anos, Martha, mas você é a tia das duas pessoas que mais amo nesse mundo — falou Dawn. — Posso ser apenas uma iniciante no ramo, mas tentarei ajudá-la a recuperar seu brilho.

As duas deram as mãos e Mars deixou escapar uma lágrima solitária. Mesmo abatida, arrancar um sorriso raro daquele rosto tão judiado era mais do que qualquer pagamento.

— Luke e Lukas sabem que você está fazendo isso? — perguntou Dawn.

Mars fez que não com a cabeça.

— Eu escondi da família que perdi um filho. Eu não queria que meus sobrinhos soubessem da morte de seu priminho... Eu fui muito idiota em contar isso para uma amiga próxima, sabe? O bebê ainda estava dentro de mim quando declararam que ele não sobreviveria, ninguém teve a chance de conhecê-lo. E essa suposta “amiga” pareceu triste de primeira instância, mas um tempo depois disse: “É só tentar de novo, não é?”.

Mars apertou as mãos com força, sentindo-se cada vez mais frustrada ao lembrar-se de tudo aquilo.

— Eu não quero descartar um filho como se ele fosse nada. Eu o carreguei dentro de mim por nove meses, nenhum deles entenderia. Eu senti tanta raiva, e...

A mulher escondeu o rosto, envergonhada por sequer pensar naquilo.

—  E-eu fui uma mãe ruim? Quais os planos de Arceus para me fazer sofrer tanto nessa vida?

— Cada um reage ao luto de forma diferente — comentou Dawn. — Se você for mesmo uma mãe tão legal quanto era com seus sobrinhos, então eu tenho certeza que qualquer criança no mundo iria querer ser seu filho.

Dawn tocou de leve na mão de Tia Martha e prometeu ajudá-la com o que estivesse ao seu alcance, contanto que aquilo não cruzasse a linha do que considerava ético dentro de seus valores.

— Bem, então mãos à obra! Você não está passando calor aqui embaixo?

— É que nós estamos no lugar mais quente de Sinnoh — respondeu a ex-comandante. — Nosso laboratório foi construído na base da Stark Mountain...

 

i

 

A visão da Gardevoir de Luke se desfez no instante em que a frase foi proferida. O treinador aguardava paciente debaixo da sombra de uma árvore bebendo um Berry Juice enquanto Sophie transmitia em tempo real detalhes do paradeiro de Dawn através do Future Sight. Como Luke e Dawn compartilharam sentimentos muito fortes durante longos anos, não foi difícil para que a Gardevoir estabelecesse aquele tipo de contato.

Agora que sabia exatamente onde começar sua investigação, estava pronto para sair ao resgate de sua donzela o quanto antes.

— Bom, time, agora chega de descanso. ‘Bora trabalhar!

Seu Garchomp grunhiu preguiçoso em cima de uma pedra. Em uma lagoa ali perto, seu Kingdra fez três disparos d’água para o alto. O Dusknoir observava com os braços cruzados de cima da montanha ao lado de sua esposa, Froslass.

O treinador terminou de alongar seus braços e pernas como se há muito tempo não saísse para se aventurar, subiu nas costas de seu Bastiodon e começou a planejar a longa trajetória em direção da Stark Mountain enquanto analisava um mapa turístico da região.

— Então eu começo subindo aqui pela Rota 225, passo por aqui, entro aqui, pego esse pedacinho da Rota 226 e sigo até o final da Rota 227 que dá na entrada da montanha. Não parece tão difícil — comentou o garoto, orgulhoso por não precisar da ajuda de seu irmão para se localizar com os mapas.

Por sinal, ainda achava estranho Lukas não estar atendendo ao telefone, pois desde sábado não recebia sinal do irmão que “saíra para uma viagem com os amigos”. Parecia uma tremenda ironia que Luke preferisse passar uns dias em casa e seu irmão estivesse saindo para aproveitar, os papéis tinham se invertido completamente. Era como se tivessem trocado de personalidade, pois dentro de cada um ambas coexistiam de forma harmoniosa.

Luke ainda adorava uma boa batalha, e desde seu término com Dawn, não engajou mais em relacionamento algum. Lukas estava firme com Paula, mas os compromissos de uma entidade divina eram, bem... complicados. Às vezes ficavam meses sem se ver, e em outros casos só se viam nos almoços de família durante os feriados — que eram interrompidos com frequências por conta de fendas no espaço-tempo e conflitos que colocavam em risco todo o universo —, mas Paula adorava passar um tempo com a família Wallers.

— Às vezes eu penso em procurar alguém de novo, sabe? Juntar as escovas, compartilhar o lençol... Mas toda vez que penso nisso eu lembro de todo o trabalhão que é namorar alguém, e aí fico até com preguiça — disse Luke, parecendo conversar sozinho. — Sei lá, talvez eu tenha nascido para ficar sozinho pelo resto da vida. É. Somos como fósseis esquecidos, amigão.

Luke jogou uma Sitrus Berry para o alto que lhe escapou e foi direto ao chão. Seu Bastiodon passava vagarosamente comendo tudo no caminho.

O Pokémon fóssil caminhava de forma vagarosa enquanto seu treinador descansava em suas costas. O sol na ilha no nordeste de Sinnoh parecia ter uma temperatura completamente diferente do restante da região, Luke só passava lá quando era para tirar férias na praia e aproveitar o calor, o que o fez sentir falta de sua família.

Já era possível enxergar o cume da Stark Mountain do final da Rota 225 quando ele decidiu fazer uma parada em um vilarejo conhecido como Survival Area para reabastecer os mantimentos e recuperar seus Pokémon. Na entrada da cidade, um rapaz o berrou em sua direção assim que o viu.

— Caramba, isso é um Bastiodon?! Eu amo esse Pokémon, tanka que é uma beleza!

O rapaz em questão tinha o cabelo vermelho amarrado em um rabo de cavalo e uma mecha loira, usava roupas largas típicas de regiões quentes e botas próprias para escalar montanhas. Ele vinha flutuando na direção oposta em cima de seu Claydol que também chamou a atenção do treinador.

— Eu também me amarro, meu time inteiro é voltado para esse lado defensivo — respondeu Luke. — Que demais que você tem um Claydol! Lembro que quando eu era moleque sempre quis ter um. Teve uma vez que montei um Baltoy de massinha achando que ele ia criar vida, mas não deu muito certo.

— Meu nome é Buck. O que tu acha de termos uma batalha aqui mesmo?

— Ih, foi mal. Tô indo salvar minha amiga que foi sequestrada.

— Quê.

— Zoeira, ela pode esperar! Uma batalhazinha só pra aquecer é sempre bem-vinda.

Dawn teria que esperar. Luke desceu das costas de seu Bastiodon e ordenou que ele participasse da batalha contra o Claydol de Buck. Ele estava ciente da desvantagem de tipos, mas queria ser rápido e dar uma aulinha de improviso para mostrar quem era o rei da defesa.

— Claydol, use o Earth Power!

O Pokémon estátua moveu seus braços como se fizesse um ritual e todas as forças da natureza ao redor pareceram se mover. O chão de pedra abriu-se como se entrasse em erupção, atingindo em cheio o Bastiodon que sequer teve tempo de se proteger. Assim que a fumaça se dissipou, a criatura ossuda tirou a poeira da cabeça e abriu sua bocarra para devolver um único disparo:

Metal Burst! — ordenou Luke.

A pancada voltou tão forte que o Claydol de Buck não teve nem como resistir. Devido à habilidade Sturdy, o Bastiodon fez uso de seu contra-ataque com força total expandida e mais um pouco. A explosão foi tão grande que todos puderam sentir o chão estremecer nos vilarejos vizinhos, o vulcão inativo da Stark Mountain chegou até a expelir lava. Luke temeu ter causado um desastre natural “sem querer”, mas por sorte tudo se controlou.

— Irmão, tu não é desse mundo — brincou Buck.

Os Pokémon retornaram para suas devidas pokébolas e a batalha foi concluída. Buck limpou o nariz e fez sinal de joia para seu novo melhor amigo.

— Oh, tá de parabéns! Pelo visto tu tem uma verdadeira muralha no seu time — Buck admitiu.

— Valeu, cara. Já sou macaco velho no ramo.

— Diz aí, tá saindo para coletar insígnias?

— Quem me dera! — Luke brincou, cercado por memórias. — Passei os últimos anos me aventurando em outras regiões, mas não para participar da Liga nem nada, só quis conhecer o mundo mesmo. Agora estou de volta pra Sinnoh resolvendo algumas pendências.

— Cara, tu é maneiro, gostei de ti. Posso te levar pra conhecer uns amigos? Estamos treinando aqui na Survival Area pra participar da Battle Tower, dizem que essa região é perfeita pra...

— Pra quem já apanhou lá, né?

Buck o encarou com a expressão estática.

— Quero dizer, pra quem pretende melhorar as habilidades — corrigiu Luke.

— Pode pá! Chega mais, você vai gostar dos caras. Cada um se especializou em um tipo de estratégia, então estamos tentando obter uma sequência de vitórias inquebrável focando em nossas habilidades.

Luke dirigiu-se à cabana isolada onde Buck dizia estar alojado com seus amigos. O lugar era aconchegante e convidativo, como a pousada de veraneio que costumava frequentar nas proximidades de Pastoria quando era menino. Os sofás de tecido brega combinados com uma imensidão de apetrechos nos armários faziam parecer que estava visitando a casa de seus avós, onde nunca faltava comida na mesa e uma rede para dormir à tardezinha.

Ao passar pela porta, sorriu satisfeito por confirmar suas expectativas — se havia algum treinador focado em especializar-se em determinado status, então só podiam ser os Stats Trainers. Lá estava Riley, refinado como sempre, vestindo seu terno azulado enquanto bebericava um pouco de chá e abanava o rosto com um chapéu. Ao seu lado estava Cheryl, uma mulher que não via há trocentos anos e que estava mais linda do que nunca, parecia que o tempo vinha lhe fazendo muito bem.

— Veja só quem está aqui — disse Riley ao se levantar para cumprimentá-lo. — Luke Wallers, nosso estimado ex-campeão, detentor do recorde de menos tempo com o título.

Buck olhou para Riley, depois para Luke, em um loop infinito até absorver a mensagem.

— TU QUE É O LUKAS WALLERS?

— Não, cara. Eu sou o Luke, Lukas é meu irmão gêmeo. E Arceus me livre de ter que acordar cedo, vestir terno e gravata e aparecer na televisão todo santo dia. Me livrei do cargo de campeão e deixei a administração do governo pro meu velho, fiz minha parte. Ainda acho que dois dias com o cargo foi muito tempo.

— Mano, tu é doidão! Realizou seu sonho e abriu mão de tudo! — falou Buck.

— Eu não abri mão dele, eu o conquistei. Fui lá e ganhei, mostrei que sou capaz. Minha vida não precisa se resumir a um único sonho, agora estou vivendo inúmeros outros com meu irmão. Estou em constante mudança.

— Muitos levam uma vida toda para conseguir — respondeu Riley com um sorriso simpático. — Eu sempre soube que você estava destinado a feitos grandiosos. Por que não se senta conosco e toma uma xícara de chá?

Luke já estava quase se esquecendo de Dawn. Era maravilhoso rever alguns rostos amigos, aquilo tudo lhe trouxe uma tremenda nostalgia. Riley serviu-lhe biscoitos amanteigados, enquanto Buck fazia piadas e Cheryl não cansava de observá-lo com as mãos entrelaçadas.

— Conte-nos como anda sua vida — pediu Cheryl. — Você parece muito diferente do garoto mal educado que enfrentei em Eterna há tanto tempo.

— Eita, você ainda lembra disso? É, acho que... cresci. Me desculpe por aquilo, foi uma fase meio bosta — Luke caiu na risada. — Na verdade devo desculpas a muitos treinadores que humilhei naquela época. Não tinha necessidade, eu perdi a cabeça. Em minhas viagens pelo mundo descobri que existem muitos treinadores melhores do que eu, e todos foram muito respeitosos comigo. Não há necessidade em ser otário com alguém só pra se sentir poderoso, tem que ter o ego muito frágil pra isso, e eu precisei apanhar pra perceber.

— O que importa é que você está arrependido — respondeu Riley. — Acho que o tempo faz bem a todos nós.

— Ô, se faz! — respondeu Luke observando o decote de Cheryl. — Há muito tempo Riley me contou que fazia parte de um grupo de treinadores muito poderosos em Sinnoh, fiquei surpreso ao vê-los reunidos aqui.

— Estamos tentando reunir os Stats Trainers originais outra vez, mas só viemos nós três — respondeu o homem. — A Marley foi visitar a família em Galar, e a Mira tinha vestibular marcado pra esse fim de semana.

— Vestibular? Mas Mira não era aquela garotinha de uns dez anos que tinha esse tamanho, e... — Luke chegou a uma súbita conclusão. — Meu Arceus. Tô ficando velho.

— E seu irmão? — Cheryl perguntou com um sorriso doce.

— Ah, tá por aí. Nós fazemos tudo juntos, mas também não vivemos grudados. Cada um precisa do seu espaço. Acho que estamos em busca da nossa “próxima grande jornada”, pesquisando os melhores lugares para se visitar, planejando viagens... Vai dar bom, tenho grandes expectativas pra esse ano.

— E o que o traz à Survival Area? — Riley voltou a perguntar. — Não creio que esteja precisando de treinamento

— Na verdade, eu vim para ajudar uma amiga que foi seques... — Luke levantou-se de forma abrupta da cadeira. — PUTA MERDA, EU PRECISO IR SALVAR A DAWN!

— Ah, a história da mina sequestrada era verdade? — perguntou Buck.

— Pelo visto você continua sendo um imã para confusões, não? — Riley falou entre risadas. — Lembro-me até hoje de nossas aventuras pelo Templo em Snowpoint... Olhando para trás, até que sinto um pouco de saudade disso.

— Nem me fale. Estou super nostálgico ultimamente — respondeu Luke. — Agora, se me derem licença, preciso bancar o super-herói.

— Ela ainda é sua namorada? — perguntou Cheryl.

— É minha ex. A gente terminou faz uns anos.

— Oh. Lamento — disse Cheryl, mas na verdade ela não lamentava nada. — Mande lembranças a ela.

— Tu é muito gado pra ainda conversar com ex — falou Buck.— Mas gente, se a mina foi sequestrada POR QUE ESTAMOS AGINDO COMO SE FOSSE UMA COISA NORMAL?

— Pare de falar como se usasse o Caps Lock ativado o tempo todo — pediu Riley.

— É que acontece com certa... frequência — respondeu Luke com uma risada calorosa. — Povo, foi um prazer revê-los, valeu pelo fanservice. Qualquer hora dessas vamos todos para a Battle Tower quebrar alguns recordes, perder, e voltar aqui para chorar. Me aventurar por Sinnoh e ter conhecido vocês foi uma das maiores alegrias de minha vida.

Os três integrantes dos Stats Trainers se levantaram para despedir-se de Luke e levá-lo até a saída. A distância era curta até a Stark Mountain e Buck ofereceu-se para guiar o rapaz, pois conhecia bem aquelas rotas, mas Luke alegou que não iria demorar e preferia não ter ninguém para atrasá-lo na escalada.

— Estou feliz em vê-lo, Luke Wallers. Você mudou de verdade, e para melhor — disse Cheryl, dando-lhe um abraço gentil. — Da última vez que o vi você era um menino, e voltou como homem.

— Puxa, fico lisonjeado — ele agradeceu. — A senhorita também está oh, uma belezura, Cheryl! Puro charme maduro.

— Você não acha que sou velha demais para você? Heh, heh. Um galanteador, como sempre — Cheryl sorriu. — Se quiser, eu tenho uma amiga solteira que é a sua cara. Ela é fascinada num novinho. Quer que eu te passe o Zap Zapdos dela?

— Opa, só mandar — respondeu Luke já com seu PokéNav que adquirira em Hoenn em mãos. — Qual o nome dela?

— É Fantina.          

Segundos depois, Luke estava escalando a montanha mais rápido que um Floatzel.

Enquanto o observava se distanciar, Riley sentiu que ainda havia certa aura mágica ao redor do garoto, como se Luke e Lukas nunca deixassem de ser crianças — treinadores e coordenadores sonhadores disputando insígnias e fitas pela região em busca de seus sonhos. Viver ao lado deles era como ser eternamente carregado de volta para o passado — não que aquilo fosse ruim, pois alguma coisa na maneira como aqueles garotos falavam e agiam o fazia sentir que tudo sempre terminaria bem.


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