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Posted by : CanasOminous
Sep 7, 2014
Capítulo 10
Você não está Sozinho
Os olhos da menina se ofuscaram como os de uma criança com o brilho
translúcido dos raios que passavam pelas persianas do cômodo branco.
Especificamente naquela tarde chovia, e muito, mas o sinal da chuva lá
fora não era uma mensagem ruim, e sim, de que tudo havia voltado a ser como
era, fazendo jus à típica rotina da menina.
Helen sentia-se bem
por ser diferente e ter sua própria forma de viver. Tudo transmitido em um
fração de segundos em que ela abriu seus olhos
tentando raciocinar mais precisamente onde estava. Tudo que ela podia
olhar naquela posição era a chuva a cair e escorrer pelo vidro da janela do
quarto, e assim permaneceu sentindo tamanha paz como há muito não sentia. Era
como se não houvessem problemas e nem deveres, sua única ambição era ficar ali
deitada mergulhada em seus próprios pensamentos.
Era noite, por algum
motivo ela se lembrava de ter ido dormir ao anoitecer e agora despertar com o
céu ainda coberto pelo véu noturno. Helen dormiu praticamente um dia inteiro
desde seu incidente caseiro, ainda sentia sua cabeça latejar ainda que com
menor intensidade. Sentiu tamanha calma que gostaria apenas de permanecer
aconchegada naquela cama branca, mas precisava mexer-se depois de tanto tempo
parada, além de estar morta de fome.
Assim que ela
virou-se pôde ver Wes de braços cruzados e a fronte baixada. O rapaz deu um
pulo da cadeira ao ver o primeiro sinal de reação vindo da menina. Ele repetiu
o nome da garota em voz alta, e então do lado veio o pai que aguardava no lado
de fora. O homem segurou a mão da filha com enorme amor e ternura, demonstrando
naquele gesto toda sua vontade de abraçá-la.
— Filha, querida!
Como está se sentindo? — perguntou o pai.
— Bem... — respondeu
Helen com uma voz cansada — Onde estou?
— No Hospital. Você
passou o dia inteiro aqui, mas terá de ficar mais algumas semanas para alguns
testes. Tem problema para você?
— Não... — assentiu
ela, tentando recuperar-se aos poucos. Desviou seu olhar para Wes ao lado
e revelou um largo sorriso ao ver o amigo, repetindo o nome do rapaz bem
baixinho. — O que está fazendo aqui?
— Matando
aula. — ele disse sem esconder um pouco da gratificação — Você
teve licença para faltar hoje, e permitiram que eu acompanhasse. Legal, né?
Helen riu, parecendo
ser aquela a melhor mensagem que recebera no dia. Em seguida Wes parou ao lado
da menina e enfiou as mãos no bolso um pouco sem graça.
— Que palavras zuadas
eu fui escolher, não? Eu deveria ter preparando algo mais bonito para quando
você despertasse.
— De maneira alguma,
você ficou aqui comigo, e é isso que importa.
A menina virou-se
então para seu pai e disse:
— Esse aqui é o Wes.
Ele é o meu amigo de escola, e tem cuidado de mim o tempo todo. O tempo todo. —
repetiu, alegando como se Wes fosse seu próprio Groudon que a protegia dia após
dia em suas aventuras.
O pai ficou feliz em
saber que o rapaz a ajudara nos tempos de necessidade. Wes agradeceu o elogio,
mas logo deixou a sala para que pai e filha ficassem a sós por um momento. O
homem estava de braços cruzados e observava tudo com calma. Ele era bem velho e
estampava uma feição cansada, provavelmente não havia dormido desde que soubera
do acidente da filha, mas naquele instante tudo valia a pena ao ver seu maior
tesouro seguro e dando sinais de melhora.
— É um rapaz muito
bondoso. Ele é do tipo que esconde as dificuldade por trás de um sorriso e traz
uma sensação de bem estar para todos ao seu redor. Parece ser um menino muito
especial mesmo. — comentou o senhor com um sorriso — Sua tia me
disse que vocês saíram juntos, não?
— Hm... Foi
sim... — respondeu ela um pouco inseguro — Não tem problema?
— Ora, é claro que
não, querida. Você tem todo o direito de saber o que quer para sua vida e com
quem anda, só espero conhecer esse rapaz melhor qualquer dia desses, mas
prometo não assustá-lo. — brincou o pai.
— Ele cuidou de
mim. Acabou que aconteceram todas essas coisas malucas e eu vim parar no
hospital, mas juro que ele não tem nada haver com isso. Foi um acidente
particular. — respondeu Helen.
— E que susto você
deu na sua tia, desmaiar assim de noite é perigoso. Você escorregou?
— Sim, acho que cai
da cama. Sei que estou meio grandinha para essas coisas, mas...
— Mas acidentes
acontecem mesmo. Sempre com as melhores famílias — respondeu ele com um
sorriso, aproximando-se da menina que lhe deu um abraço.
— Que bom que você
veio, pai, fico feliz que esteja aqui comigo.
Os dois ficaram
abraçados por um tempo, e então o pai sentou ao lado da menina na cama enquanto
acariciava uma de suas mãos.
— Eu precisava ver
como minha filha estava. Por sorte sua tia e aquele rapaz estavam com você e
nada de pior aconteceu. Ellie, acho melhor eu voltar a ficar com você do meu
lado...
— Pai, eu não sou
mais uma criança. — disse ela um pouco aflita— Digo, posso até ser, tenho
pensamentos e jeitos infantis, mas nem por isso você pode me impedir de
continuar seguindo meus objetivos. Não posso ficar para sempre debaixo de sua
asa, não é, pai?
— Sim, sim. Você está
certa, mas enquanto eu estiver aqui continuarei fazendo de tudo para seu bem
estar, quanto a isso você não pode fazer nada. Você sempre será minha filha.
Helen explicou todos
os acontecimentos até então, ainda que mantendo a presença dos Pokémons um
sigilo total. A doença de Helen havia se tornado mais fraca nos últimos anos,
mas especificamente com toda a pressão e agonia daquele ano ela havia retornado
com maior intensidade.
Os dois conversaram
por um tempo sobre questões escolares. A chuva ainda escorria pela janela e aos
poucos as pessoas iam deixando o hospital para retornar para seus lares. O pai
virou-se e olhou para os aparelhos presentes na sala, checando-os.
— Você vai ter que
voltar a tomar aqueles remédios. — afirmou.
— Aqueles que eu
odiava, né? — indagou Helen, ainda deitada na cama e com os aparelhos do
hospital a sua volta. O pai sorriu e afirmou:
— São esses mesmo.
Mas fique tranquila. Tudo vai ficar bem.
Por um momento Helen
pareceu lembrar-se do que Will lhe dissera na última noite. Ela tinha poucas
lembranças do que acontecera, não sabia que tinha ligado para o pai, mas
lembrava muito bem de uma frase de seu Pikachu que fixara-se em sua
mente: As pessoas mentem para nós. São todas pessoas
falsas, amigos falsos, uma vida falsa... Tudo vai ficar bem, é o que dizem,
quando na verdade não vai ficar.
— Pai, eu sou doente,
não sou? — perguntou ela, não recebendo uma resposta do velho homem. Os dois
ficaram em silêncio como se o pai temesse por aquela pergunta há tempos,
posicionou suas mãos para trás e continuou:
— Por que está
dizendo isso?
— Por quê você diz
que tudo vai ficar bem quando você sabe que não vai.
O homem ficou em
silêncio, querendo saber quem havia dado aquelas ideias ridículas para sua
filha, mas Helen foi mais rápida.
— Mas pai, me diga...
Por que as pessoas mentem para mim?
— Eu não minto para
você. — afirmou ele de forma séria.
— E-Eu não estou
falando de você, mas do mundo. Você sempre disse que devo sonhar, mas eu não
tenho essas condições... Você sabe que as coisas não vão ficar bem, e ainda
assim me empenha a continuar seguindo e sempre diz essa mesma frase...! Por
quê?
As palavras proferidas
soaram chorosas e confusas. O pai deu um leve abraço na filha que tinha a
cabeça enfaixada e os olhos cobertos de lágrimas.
— Filha, você tem
todo o direito do mundo de sonhar como qualquer outra pessoa, mas o assunto
aqui não se trata de sonhos, se trata de possibilidades. Tudo que acontece a
sua volta varia de acordo com a sua vontade e disposição, porque se você quiser
você pode fazer. Não é o destino, carma, ou uma doença que irá impedi-la de
conquistar o que procura.
Helen soluçava ainda
abraçada ao pai. Ela ficou a observar os pingos insistentes escorrerem na
janela um tanto quando agradecida por finalmente ter dito aquelas
palavras que há tanto tempo se prendiam em sua garganta O pai abraçou-a com
mais força e continuou:
— As coisas podem não
terminar como queremos, mas uma coisa eu garanto: Você não precisa passar por
tudo isso sozinha. Nós sempre estaremos aqui do seu lado para cuidar de você.
O momento de
reconciliação de pai e filha durou um bom tempo, e ao término dos exames foi
Wes quem adentrou a sala. O rapaz passou pela porta branca enquanto o pai da
menina mantinha os olhos bem fixos na presença do jovem ao lado de sua filha,
pois era sempre fora um pai muito protetor. Ele fechou a porta e Wes ficou ali,
a examinar Helen naquela situação com a cabeça enfaixada e os olhos inchados de
tanto dormir, mas ainda assim a menina sorria como se todos os problemas de sua
vida desaparecessem quando estava ao lado de quem gostava. Wes caminhou até a
cama de Helen e mexeu no cabelo curto da menina como costumava fazer.
— Ai! — disse ela.
— Vish, foi mal,
esqueci que você está com a cabeça machucada. É a força do costume. É que eu
gosto de tocar no seu cabelo, é macio.— riu Wes um pouco sem graça — Que coisa,
você está com o cabeção inteiro enfaixado e eu ainda faço isso, sou um mané
mesmo.
— Não tem problema,
foi bom vê-lo novamente...
Wes caminhou até uma
mochila que estava em cima do sofá, e assim, retirou algo dali de dentro. Era
uma pequena caixinha de bombons toda remendada e com fitinhas vermelhas. Helen
corou ao ver o presente, coçou a cabeça revelando um sorriso espontâneo vendo
Wes agir da mesma maneira em sua frente.
— Fiquei de te
entregar isso ontem à noite.
— Wes, obrigada pelo
presente... — comentou ela bem baixinho, notando então algo gosmento nas bordas
do pacote — Ah, acho que está vazando...
— Vish, derreteram
tudo os chocolates! — respondeu ele apreensivo, vendo Helen abrir a caixa que
havia praticamente virado uma piscina de açúcar amarronzada. Helen virou-se
para Wes que ficou sem reação, mas em seguida ela soltou uma longa risada.
— Você sujou toda a
roupa de cama branquinha do hospital! E agora, vão pensar que essa mancha
marrom no tecido é o que?
— Bom, pelo cheiro de
doce eu teria certeza de que é chocolate, mas vendo assim de longe... —
disfarçou ele — Ahh... Caramba... Foi mal, Helen. Eu sempre dou essas mancadas
quando preparo algo para você.
— Não tem problema,
podemos fazer chocolate quente quando chegarmos em casa agora. — sorriu a
menina com simpatia — Ei, pode me dar uma ajudinha aqui...? Não quero ficar
deitada nessa cama toda suja agora. Preciso me levantar.
Fazia muito frio
naquela tarde. O barulho insistente dos pingos era o único som que podia ser
ouvido na sala. Helen vestia um blusão de lã que parecia mais um vestido em seu
corpo e a mantinha confortável e aquecida. Wes aproximou-se da menina que
tentou sair da cama aos poucos, ela apoiou-se na ponta como se tentasse
reaprender a andar, e em sua frente tinha alguém ao seu lado disposto a
segurá-la. Suas pernas cambalearam ao entrarem em contato com o chão, o rapaz
segurou a menina por trás que apoiou-se em seu peito para não perder
o equilíbrio. Helen ergueu seu olhar e ficou a observá-lo.
— Hm. Agora entendi
como você bateu a cabeça e desmaiou. Também, com um par de perninhas finas
desse jeito até o vento consegue te derrubar. — brincou ele.
— Bobo. — respondeu
ela, tocando na mão direita de Wes que acabou por segurá-la quase que de forma
automática.
Helen corou ao ter
sua mão segurada daquela maneira. Ela podia sentir os braços do rapaz a
sustentá-la, Wes também encarou as mãos sobrepostas com certa atenção, abriu-as
lentamente e aos poucos entrelaçou as duas como se fossem uma. Helen sorriu ao
ver o ato, o som da chuva tornou-se praticamente nulo quando apenas suas
respirações podiam ser ouvidas no cômodo, sentiu um arrepio subir-lhe a espinha
somente pelo calor que sentira com aquele abraço terno e espontâneo. Gostaria
nunca mais deixá-lo.
Os dois ficaram de
mãos dadas por um tempo como se não quisessem deixar que o outro partisse.
Helen encostou sua cabeça no peito do rapaz e soltou um longo suspiro ao
pensar:
— Você é meu amigo,
não é?
— Qual é, eu não vou
sair do seu pé tão cedo.
Helen manteve-se
quieta, lembrando-se do que Will dissera para ela a respeito de Wes. Por mais
que os dois se amassem, e se no futuro ela realmente fosse um peso morto na
vida dele? Seu pai dissera que ela poderia continuar sonhando, mas ainda assim,
ela não se sentia no direito de atrapalhar a vida dos outros com seus
problemas, e o que ela menos gostaria no mundo era atrapalhar o rapaz. De
maneira súbita chegou a perguntar:
— Wes, eu... Você vai
continuar a me visitar, certo?
— Sim, provavelmente.
Só de manhã que não, não vou poder mais faltar às aulas, estou quase estourando
de faltas.
— Mas... Por quê você
vai continuar me visitando? Eu não quero isso...
Wes calou-se e
permaneceu quieto. Lentamente foi soltando a mão da menina até afastar-se para
poder encará-la com as bochechas rosadas ainda quentes e coradas. Enfiou as
mãos no bolso já que não tinha mais o que segurar, e mordendo os lábios
respondeu de forma pensativa:
— Se não quisesse que
eu ficasse aqui era só avisar.
— Eu só não quero me
tornar um incômodo para você e sua vida...
Wes voltou a observá-la,
mas dessa vez estava surpreso com o que acabara de ouvir.
— Qual é, esse é o
motivo? Você tem medo de me atrapalhar? Helen... Não diga essas bobeiras...
Helen esfregou sua
mão em seu rosto tentando escondê-lo para não demonstrar a tristeza, por um
momento sentiu como se quisesse ficara lado do ruivo para o resto de sua vida,
mas seu outro lado teimava que o deixasse para que ele tivesse uma vida melhor.
A moça escondeu o rosto e não escondeu algumas lágrimas que rolavam
involuntariamente.
— Eu gostei tanto de
você que eu lamentaria muito se te perdesse algum dia, mas sei de minhas
condições e sei que tipo de aflição você pode passar ao meu lado. Minha mente
diz para te deixar, mas meu coração implora para que fique ao meu lado. O que
eu faço?
Wes afastou-se um
pouco, pois nunca antes tinha recebido uma confissão tão honesta de alguma
garota. Ou poderia até ter recebido, mas nunca antes de alguém que amara tanto.
Helen abaixou a fronte novamente e limpou as lágrimas, porém, nesse instante
ela pôde sentir alguém agarrar seu braço e puxá-la para perto de si.
— Não me importo de
passar por momentos difíceis, mas há certas coisas que a gente não escolhe,
elas simplesmente acontecem. — ele soltou um suspiro e passou sua mão
suavemente sobre o rosto da garota — Foi por você que eu me apaixonei, e por
você vou continuar lutando.
Helen encolheu-se
para que pudesse abraçá-lo e o sentisse em seus braços mais uma vez naquela
noite. Ela sempre teve seu Groudon ao seu lado, mas nunca pôde senti-lo
fisicamente, e agora sentia cada parte de seu corpo como se ele estivesse ali
presente, pronto para defendê-la da maior aventura de todas, a própria vida. Em
sua mente a menina continuava distante, e uma última vez pôde ouvir uma voz
rústica e grandiosa:
— Eu sempre
vou cuidar de você.
Groudon? — pensou ela, agora notando que havia apenas o seu amigo ao seu
lado. Ela mais uma vez confortou-se em seus braços e sorriu:
Você sempre esteve
aqui comigo, não é? Obrigada por ficar ao meu lado, obrigada por ser meu amigo.
Por mais que este seja nosso adeus, eu prometo que farei de tudo para mantê-lo
em meu coração. É o meu último desejo. Obrigada, Wes. Muito obrigada.
• • •
Os dias seguintes no
hospital passaram com pressa, e a mente de Helen nunca mais foi incomodada. A
menina não deu falta de Will ao chegar em casa, chegou a perguntar uma ou duas
vezes para sua tia onde ele estava, mas a mulher afirmou que não o vira mais desde
que ela fora para o hospital.
Houve um dia em que
Helen foi para o banheiro e fitou-se no espelho. Seu cabelo nunca mais ficou na
altura que era antes, isso porque ela passou a cortá-lo da maneira que Wes
gostava e ela também sentia-se mais livre para se expressar. Ao ver seu reflexo
lembrou-se de seu Pikachu, da forma como sua mente quase a transformou em um
Pokémon para que ela deixasse sua vida real para trás apenas para viver a
ilusão de algo que não existia.
Por que fiz aquilo
comigo mesma? Perdi minha cabeça em um pequeno erro, eu estava perto de deixar
meu verdadeiro eu na prateleira. — pensou na forma como
estava para perder sua identidade para seus pensamentos, ela não sabia nem
mesmo tomar decisões sem que Will a influenciasse.
Quando voltou para a
aula foi recebida por todos de braços abertos. Acabava encontrando-se mais
atenta nos estudos para não ter notas ruins daquele semestre em diante e, certo
dia, encontrou-se perdida escrevendo na última página de seu caderno:
Não perca
quem você é dentre o brilho das estrelas. Ver é enganar, sonhar é acreditar. Às
vezes é difícil seguir seu coração, mas as lágrimas não significam que você
está se perdendo. Basta ser verdadeiro com quem você é.
Infelizmente, Helen
acabou por perder algumas provas na escola com o tempo internada, mas
aquilo não atrapalhou suas condições no vestibular que prestou. Ela passou a se
esforçar com os estudos sempre contando com a ajuda dos professores e de
Stella, até mesmo Wes se oferecia para ajudá-la sempre que possível, e agora
naquele último bimestre a atenção do ruivo havia sido redobrada, ele nem mais
faltava às aulas chatas do professor de química.
As semanas foram se
passando e aos poucos a data mais importante dos vestibulares no fim do ano se
aproximava. Era uma época de apreensão em que todos davam seu melhor para
estudar, alguns dependiam totalmente daquele resultado, e no caso de Helen não
era diferente. Ela também almejava tornar-se alguém e seguir seus objetivos, e
por mais que ainda estivesse um pouco perdida sobre qual área prestar ainda
tinha esperanças de que faria a escolha certa.
Certo dia sentou-se
no fundo da sala ao lado de Wes e seus amigos. O ruivo pegou o celular da
menina e começou a mexê-lo enquanto Helen lançava-lhe um olhar de dúvida. Ela
apoiou o braço na mesa do parceiro e perguntou:
— O que o senhor está
procurando em meu celular? Saiba que não tenho nenhum tipo de foto minha semi
nua ou de outro garoto nele. — brincou ela.
— Não, não. Pior que
dessa vez não quero ver nenhuma foto, estou preparando outra coisa. Um presente
especial. Credo, sou do tipo tão tarado assim que procura esse tipo de fotos
das garotas?
— Fica fria, Helen.
Ele está te enviando uma foto dele só de cueca exibindo esses músculos malhados
de academia. Então só fique quieta e aproveite o resultado! — brincou
Stella.
— Como vocês duas são
terríveis, eu sou um homem muito honrado. — respondeu Wes — É só um
presente para a Helen mesmo, mas na hora certa ela saberá o que é.
— Não consegue ser
mais discreto ao preparar algo, não? — brincou a menina.
Provavelmente aquela
era a intenção de Wes. Ele queria que a amiga soubesse que ele preparava algo
importante para ela, e embora ainda não tivesse dito o que era pretendia deixar
a dúvida instalada na mente da menina. No dia seguinte o despertador de seu
celular despertou, porém, algumas horinhas mais tarde do início da aula. Helen
agarrou o aparelho e seus olhos se arregalaram.
— Nove horas?! Como
pude perder o horário dessa maneira??
Helen correu para
aprontar-se e saiu do apartamento feito um foguete. Nem mesmo Wes teria se
atrasado tanto para a aula, mas para sua surpresa assim que dobrou a esquina
antes da escola pôde ver o rapaz a aguardá-la. Helen correu bufando
ao entender o plano que ele mencionara na manhã passada.
— Você atrasou o
despertador do meu celular, não foi? Só para eu chegar atrasado junto com
você?! — indagou ela frustrada, o que fez Wes cair na risada.
— Sim, curtiu a
surpresa? Em partes você acertou, eu queria mesmo que você chegasse atrasada
junto comigo, mas não para entrar na escola.
— Como é?
— Venha, vamos para
outro lugar.
— E quanto à escola?
— Já estamos
atrasados mesmo, que diferença faz? Prometo que será a última vez.
Helen cedeu ainda que
um pouco pensativa, não sabia quais seriam os planos do amigo, mas pretendia
segui-lo aonde fosse. Wes levou Helen até um parque que havia lá próximo,
árvores belas cortavam o céu e alguns adultos já faziam seus exercícios
diários. Havia um pequeno banco próximo a uma fonte, Wes jogou sua mochila lá e
sentou-se na companhia de Helen. A menina virou-se para o companheiro e
perguntou:
— Então, qual é o
motivo desse encontro? Quero dizer, me expressei errado, isso não seria bem um
encontro, podemos dizer que estamos matando aula.
— Não, pode chamar de
encontro mesmo. — respondeu Wes um pouco sério. Normalmente àquela altura o
rapaz estaria brincalhão e fazendo questão de bagunçar o cabelo da menina, mas
dessa vez nada fez. Ele segurava as mãos entrelaçadas e uma de suas pernas
permanecia em constante movimento. Wes engoliu seco, e em seguida virou-se para
sua amiga:
— Helen. Eu vou sair
da cidade muito em breve.
A menina ficou
estática tentando entender o motivo da mudança. Seria por culpa dela? Seria
para evitá-la? Os pensamentos lhe correram rápidos, mas Wes foi astuto e rapidamente
explicou os motivos antes que ela ficasse ainda mais entristecida.
— Vou me mudar para
realizar um vestibular em outra cidade. Não há cursos para a carreira que eu
quero aqui, então eu precisaria me distanciar por um tempo.
— Você... Não
pretende voltar?
— Pretendo, sim. Mas
só depois de me estabilizar e ter certeza de que tenho um bom futuro. É um
curso profissionalizante, são três anos, então até lá receio que nos veremos um
pouco menos.
Helen abaixou a
cabeça um pouco chateada. Ela sabia. No fundo sabia que o próprio Wes teria uma
desculpa para evitá-la de modo que cada um seguisse seus rumos, mas ergueu a
cabeça e perguntou:
— Por quê me disse
isso?
— Porque quero que
você me espere. — respondeu Wes com um sorriso sereno — Se você prometer que irá,
eu também prometo que nunca irei deixá-la sozinha.
Wes aos poucos aproximou-se mais da menina. Helen ergueu seus olhos e encarou os deles que aos poucos transmitiam conforto e aproximavam-se mais. Ele segurou nas mãos dela e entrelaçou-as como da primeira vez no hospital, e assim, Helen fechou seus olhos e apenas sentiu o que até então nunca havia imaginado. Ela recebeu um beijo terno e macio dos lábios do rapaz, sentiu-se envolta por uma imensa felicidade que nunca antes poderia ter descrito em suas estórias, e no vasto campo da Ilha dos Sonhos de sua imaginação viu seu maior sonho ser realizado.
Helen foi aos poucos
abrindo seus olhos de forma ofegante. Foi um beijo suave e acanhado,
ela não sabia ao certo o que fazer e por isso apenas deixou-se ser levada.
Quando Wes voltou a encará-la mudou sua feição e esboçou seu sorriso
costumeiro, bagunçando o cabelo da menina e rindo.
— Eu é que não estou
afim de ir para a aula agora. Topa um chocolate quente?
— Só se você for em
casa mais vezes para me ensinar essa matéria que vamos perder hoje.
— E como você quer
que eu te ensine se eu também faltei? Hah, hah, hah... Vamos lá, eu pago o
seu drink. Temos que aproveitar enquanto eu ainda estou aqui, não
é? Você tem mais três meses para me aguentar. E depois, quem sabe uma vida
inteira.
O ano chegou perto do
fim, e em pouco mais de um mês Wes estaria saindo da cidade, mas antes faria
questão de levar Helen com sua tia para quando ela fizesse seu primeiro
vestibular. Ele não ligava de esperar várias horas, estava presente desde então
para dar o apoio nos estudos e agora faria questão de estar presente naquela
última etapa.
Helen entrou na sala
ansiosa, tentava manter-se controlada mantendo as energias positivas e dizendo
para si de que tudo terminaria bem. A clara mentira de que "Tudo vai ficar
bem". Tentou realizar a prova com o máximo de calma possível, e por fim,
na redação havia um tema muito curioso a se trabalhar: A Mente Humana.
Começou a escrever os
parágrafos como se aquele tema fosse dedicado à ela. Lembrou-se do que aprendeu
com seus Pokémons, com a Suicune, com sua Mew, com seu Registeel Químico, com o
próprio Will, com o Giratina, com Groudon... Ela precisava apenas conectar cada
pensamento que tivera e transmitir para o papel. E nas últimas linhas, em um dos
trechos da redação ela escreveu:
“As
pessoas mentem para nós. ‘Tudo vai ficar bem’, é o que dizem.
Mas, e se não
ficar? E se for algo que você herdou? E se a dor estiver presente no seu DNA, e
a tragédia seja sua sina? O que cada um de nós faz, além de mentir?
Por mais que
tudo conspire para que deixemos a vida para trás e apenas apertemos o
botão delete para recomeçar
do zero, devo dizer que há alguém ao seu lado que está disposto a ajudar você.
Dar apoio, perdoar, esperar por você, aguentar sua barra, beijar, amar você.
Então, mesmo que tudo não esteja nada bem, eu sei algo que é verdade: Ninguém
precisa ficar sozinho nesta vida.”
Muitos se esforçam
para conseguir as melhores faculdades, cada qual movido por seus respectivos
sonhos e objetivos. Por mais que Helen não tivesse se saído bem em
matérias exatas, sua redação fora o suficiente para classificá-la no curso
desejado, e sua meta havia sido cumprida. Poucos meses depois Wes foi embora em
busca de seus próprios objetivos. Todos os fins de semana ele voltava para sua
cidade natal somente para visitar o apartamento miúdo de uma garota
que contava os dias para que o fim de semana logo chegasse.
Helen estava feliz
com sua conquista e também com o caminho que sua vida passou a tomar.
Continuou ao lado de Wes prometendo cumprir o desejo de Groudon, mas se a
promessa foi cumprida até o final, isso não posso dizer. Apenas devo citar que
invicto foi a vitória de um dragão de cor escarlate, o guardião do Amor que
jamais perdeu uma batalha ao lado de sua treinadora.
E, no fim, ela
simplesmente viveu.
Cada minuto seguinte,
cada hora e dia que se passava a jovem Helen agradecia pela vida. Não teve
filhos, não chegou a passar o seu legado, mas até o fim de seus dias viveu
sonhando e concretizando cada Vontade; viveu à sua maneira; conquistou sua
própria identidade e não a perdeu para mais nada.
Se Machado de Assis começou sua narração postumamente, então essa pequena garota começará a partir de agora. Esta foi a vida de
Helen Berlitz, uma garotinha solitária doente que havia se tornado uma
treinadora aventureira, que quase veio a tornar-se um Pokémon, e, para no fim de
sua vida, seu livro eterno fosse conhecido apenas como “A Vida de Helen
Berlitz”.
que fim mais bonito ;)muito bom!
ReplyDeleteby:Koala
Valeu, Koala! :D Estou considerando trazer uma outra fanfic minha para cá,a Burning Love que conta uma história em Hoenn. Eu tinha ela postada na Arena também, mas a fic acabou indo junto com o site, pelo menos ainda o tenho no Nyah.
DeleteAproveitando o embalo que Hoenn trará acho que será uma trama bem legal de se acompanhar, Heart of Child tinha um enredo um pouco voltado para o drama, especialmente no final, e geralmente os leitores aqui de Sinnoh curtem algo mais na aventura ou romance. Vou ver se sobra tempo de mandar a fic pra cá tempo, e mais uma vez, fico feliz que tenha acompanhado a fic, obrigado!