— Esperem! Como posso agradecê-las?
Ao chamar, uma única Nidoran parou e olhou para trás. Era idêntica à pequena criaturinha morta em sua frente por Beliel, tinha inclusive os mesmos olhos e Lukas sabia que não iria esquecê-la tão cedo. A imagem do Pokémon parecia formar-se como uma criança em sua mente, e o garoto chegou inclusive a esfregar seu rosto para certificar-se de que não estava sonhando. A menina tinha olhos expressivos e uma feição de cansaço passível, seus cabelos eram curtos e lisos, presos em um broche delicado na altura das sobrancelhas As algemas a cobriam das mãos até o pescoço. A criança sorriu e acenou a cabeça num gesto simples e sereno.
"Você já nos agradeceu se importando conosco, mesmo que sejamos apenas cópias. Nós o agradecemos por se importar com a gente. Obrigada, de coração, se é que ainda existe um dentro de mim..."
A criança virou-se, e quando Lukas libertou-se de seus devaneios viu apenas a pequena Nidoran partir de volta para as sombras, e lá permanecer para nunca mais ser encontrada.
Lukas perguntou-se do motivo daquilo, da estranha conversa com uma criatura sendo que nos últimos dias ele se mostrara muito mais próximo de Pokémons do que imaginara. Ao libertar-se de seus pensamentos olhou para trás e encarou o portão de ferro, segurou-o com os dois braços e o empurrou ouvindo o ranger pesado e tortuoso a cada centímetro entreaberto do portal. Encarou o cenário a sua frente com certo espanto, era um corredor de celas que pareciam já estar abandonadas há muito tempo, todas em condições precárias e instrumentos de pesquisas espalhados no chão, armários eram despojados e papéis sujos cobriam o chão como um manto de folhas de uma árvore descabelada. Uma estátua de ferro erguia-se no meio da prisão, e nela a figura honorária de um humano mantinha a fronte erguida e a mão esticada num sinal de progresso.
As celas eram dispostas em forma circular, e no centro do salão erguia-se majestosamente a imagem do que já foi o maior líder da corporação dos Rockets. Lukas caminhava com desconfiança, tentou ler os manuscritos no pedestal, mas já estavam apagados e corroídos pelo tempo. Subitamente pôde ouvir um barulho. Virou-se para encarar de onde vinha o som com mais atenção, e pôde finalmente ver uma pequena figura agachada em um canto escuro da prisão.
Seu coração por um instante parou de bater, ele sentia como se seus olhos lhe pregassem uma peça, deixou de lado a desconfiança, a tristeza, o cansaço, correu com todas as forças que podia para o encontro daquela figura que podia não ser seu irmão, mas a euforia era tanta que este pensamento nem lhe passou pela cabeça. O garoto mal se atentou ao detalhe de que aquela cela estava aberta e com seu cadeado quebrado e escancarado no chão frio de mármore, entrou e não se deu conta de mais nada ao ouvir as palavras saírem de sua boca num sussurro de dúvida e reconciliação.
— L-Luke?
O garoto, quase desacordado, ergueu os olhos e por um instante foi como se encarasse a si mesmo. Parecia que estava vendo seu reflexo em um espelho, o jovem esticou uma das mãos com dificuldade e sentiu-as tocar levemente o rosto do irmão que já correra para socorrê-lo. Luke acariciou-lhe a face, contornando os detalhes, querendo segurar-se à certeza de que aquele que estava a sua frente não era uma mera ilusão de sua mente desgastada, e sim, seu verdadeiro irmão.
— L-Lukas? Lukas... Lukas... — chamou ele com a voz cansada.
O garoto tinha lágrimas nos cantos do olhos, segurou a mão de Luke com força e aproximou-a mais de si.
— Luke, sou eu. — respondeu em um sussurro, sua voz quase não saindo.
Os dois não esconderam um sorriso semelhante e imediatamente se abraçaram para o consolo um do outro. Luke desabou quando encostou-se no ombro de seu irmão e amigo, o jovem prisioneiro tinha os pés machucados e o rosto ferido, seus olhos pareciam quase estar fora de si e o sangue já ressecado demonstrava longas 12 horas de agonia naquele lugar.
— Luke! Luke!! Sou eu, é o Lukas!!
— Eu sabia que você ia me encontrar. — respondeu com a voz trêmula.
O moreno sentia o corpo frio de Luke, retirou o blusão que vestia de seu irmão, e assim o colocou de volta em seu verdadeiro dono. No fim a troca de vestes não servira para enganar ninguém, afinal, os Pokémons possuem um faro muito mais aguçado do que qualquer humano. Ao menos seu plano infantil e até mesmo insensato servira para aquecer o irmão que quase congelava no chão frio de concreto. Em meio ao sangue que escorria da nuca do garoto Lukas pôde sentir a dor que seu irmão sofrera, era uma dor que fora compartilhada com todos ali presentes, desde humanos até Pokémons; não poucos haviam perecido, renomados ou desconhecidos, pois foi uma grande batalha e nenhuma história contou um relato completo dela.
Eles tentaram prosseguir em conjunto enquanto Lukas apoiava o irmão em seus braços, mas Luke tremia de frio e mal dava sinais de consciência. Luke tropeçou e foi ao chão novamente, mas sequer reclamou. Os dois apenas desejavam que aquele pesadelo terminasse, o tempo parecia parar como se nada mais importasse. Lukas encostou-se numa parede ofegando, apoiou o irmão dando-lhe suporte para sentar-se da mesma maneira, e assim Luke virou-se para ele sorrindo num agradecimento carregado de sentimentos.
— Pensei que nunca mais te veria.
— Não fale assim, Luke. Eu nunca, nunca te deixaria.
— Parece que eu estou sonhando.
— Eu estou aqui, Luke. Eu estou aqui com você.
Parecia que os machucados de Luke doíam em Lukas, a ligação deles era tão forte que parecia que ambos dividiam um mesmo sentimento, das mesmas dores. As lágrimas que antes estavam contidas começaram a trilhar seus caminhos pelas bochechas cheias de cicatrizes, talvez pelo alívio de terem finalmente encontrado um ao outro, um alívio de que aquele pesadelo podia ser apenas um sonho e que logo eles estariam acordados, Lukas fechou os olhos e acolheu o irmão em seus braços.
Os dois pareceram ficar daquela maneira por um longo tempo, mas poucos segundos depois Luke desabou nos braços do irmão e quase desmaiou. Lukas segurou-o num susto e deu apoio para que ele não caísse uma terceira vez. Luke olhou para o irmão e riu de forma mansa:
— Poxa, eu gostava dessa roupa cara... Vou ter que comprar outra agora...
— Não se esforce, temos coisas mais importantes no momento, você já reclama todos os outros dias do ano. — respondeu Lukas com uma risada, limpando as lágrimas do rosto de Luke — Nós podemos comprar outras roupas, mas não há nada nesse mundo que substitua você.
Luke estava feliz por ter o velho blusão de volta, mas ele já estava rasgado e desgastado de todas as longas viagens que foram feitas até então. De fato, Lukas havia perdido sua boina quando tentou fugir de Beliel, e eles claramente precisariam de um estoque novo. Luke riu, encostando a cabeça na parede fria e vendo sua respiração tornar-se mais pesada. O moreno olhou ao redor de forma breve e pareceu preocupar-se com algo, mas não se manifestou. Lukas agachou para apoiá-lo em seu ombro, perguntando na sequência:
— Você está bem?
— Onde ele está...? Você o derrotou? — perguntou Luke.
— Do que está falando?
Lukas pensou que seu irmão estivesse agoniando pelos ferimentos, mas a preocupação com que Luke dissera aquelas palavras demonstrava clara inquietação. Trazê-lo de volta a salvo para fora da ilha seria um verdadeiro desafio, mas eles estavam dispostos a seguirem juntos aquele caminho sinuoso. Mas, de repente, as luzes do setor começaram a piscar, faíscas dançaram em meio as luzes queimando duas ou três lâmpadas o que obrigou os Irmãos Wallers a se afastarem do centro do salão onde um fraco tremor pôde ser sentido. Uma sirene começou a soar, mas nenhum dos dois tinha noção do que era aquilo. Lukas olhou ao redor espantado e perguntou:
— O que está acontecendo com esse lugar?
— Ele chegou. Ele está aqui... Ele sempre esteve aqui, e por isso eu não pude escapar... — respondeu Luke com a voz amedrontada — Nós temos de sair daqui, depressa!
Lukas virou-se ao notar que toda a sala começava a ser coberta por sombras na medida que as luzes se apagavam e apenas uma restou, iluminando uma cela em especial, afastada de todas as outras. Era a solitária, o local onde os piores prisioneiros eram jogados. Lukas virou-se não podendo deixar que seu irmão caísse, mas levou um susto no momento em que a porta abriu-se sozinha e lá de dentro pareceram surgir inúmeros espíritos que se aglomeravam em um corpo sem forma. Luke tremia de forma agoniante, como se o pior de seus pesadelos voltasse a perturbá-lo.
Lukas foi arremessado para trás por uma força invisível deixando seu irmão para trás, mas algo sustentou o corpo do garoto desacordado e começou a arrastá-lo para dentro daquela cela permanente. Lukas chamou pelo nome do irmão e levantou-se correndo para agarrá-lo, mas as sombras na sala o ameaçavam e o empurravam de forma agressiva e violenta.
— LUKE!!! — ele gritou com todas as suas forças.
Havia acabado de encontrar seu irmão, e agora, aquele espírito maligno o aprisionava novamente. Tudo parecia fazer sentido, pois mesmo que a cela de Luke estivesse aberta ele nunca conseguiu fugir devido ao carcereiro que voltava a aprisioná-lo transformando sua vida em um verdadeiro pesadelo. Lukas começou a apavorar-se, imaginou o desespero do irmão em ter aquela coisa ali, sentiu seu próprio coração agoniar em dor. Quando ouviu a sirene soar mais alto, livrando-o de seus pensamentos, dois outros Pokémons surgiram na sala. Um deles era um Croagunk que com mãos ágeis como uma navalha cortou o espírito ao meio fazendo com que a criatura soltasse o jovem Luke e fazendo aquele monstro recuar em um grito estridente. Uma Yanma passou zunindo arrastando os dois para longe, a libélula permitiu uma fuga com sucesso, mas o fantasma da solitária não estava disposto a perder seu único detento. O Croagunk fechou a porta, e de longe um Porygon-Z disparou um raio de gelo que a congelou em uma blindagem azulada. Lukas virou-se para trás ao notar que eram os Pokémons de seu irmão.
— Como vocês nos encontraram? — indagou Lukas surpreso.
O barulho e os gritos de dentro da cela ainda podiam ser ouvidos, aquela batalha ainda não estava finalizada. A porta da solitária havia sido congelada, mas os espíritos saíam dela lentamente como um assassino agonia sua vítima antes do golpe final. Lukas notou claramente um sorriso macabro formar-se em meio às sombras, e lembrou-se da única vez que ouvira alguém citar o nome daquela criatura amaldiçoada.
— S-Spiritomb. — ele proferiu.
Os espíritos avançavam contra a equipe na medida que as luzes piscavam e a sirene soava como uma sinfonia final. Jade utilizava de sua habilidade para dispersar os braços fantasmagóricos do monstro enquanto Yoshiki decepava os membros inexistentes do fantasma com uma velocidade impressionante, mas logo surgiam outros espíritos e a criatura não podia ser contida por nada. Lukas segurou na cabeça de seu irmão e notou que ele aos poucos abria seus olhos.
— O que está acontecendo? — indagou Luke atordoado.
— Precisamos fugir daqui o mais depressa possível!
— Mas ele é o guardião eterno dessas prisões... É impossível fugir de sua vigilância. Eu... Eu não consigo fugir... Eu....
— Luke!! — Lukas agarrou o rosto do irmão com as duas mãos fazendo seus olhos se encontrarem — Nós estamos aqui agora! Eu estou aqui!! Não perca a confiança no que os seus Pokémons são capazes. Vamos lá, Croagunk, utilize o Sludge Bomb! Yanma, Wing Attack! Porygon-Z, Hidden Power!
Yoshiki disparou uma rajada de veneno que ao entrar em contato com o fogo criado pelas esferas da guerreira cibernética criou uma explosão altamente inflamável. A libélula fez com que seu vento arremessasse aquilo em direção da porta da solitária, que ao entrar em contato com o portão já enferrujado correu-o por completo e explodiu tudo ao redor. Lukas escondeu-se para não ser afetado pelo golpe combinativo, mas por sorte aquilo dispersaria o Spiritomb por um tempo, ainda que ele não tivesse sido completamente derrotado. A voz do fantasma ainda ecoava de furma fúnebre e melancólica:
"Vocês não vão levá-lo de miiiiiiiiiiiiiim...."
Era como Lukas ouviu, mas o jovem teve medo de olhar para trás e nunca mais dormir por aquela imagem amedrontadora. Continuou correndo sem delongas, e quando o portão de ferro foi fechado a voz desapareceu.
Para seu corpo pouco definido parecia impossível carregar alguém como Luke por um caminho tão longo. Lukas esforçava-se ao máximo, mas também estava cansado. Quando parou para tentar recuperar o fôlego pôde sentir que um enorme peso lhe fora tirado das costas, e ao virar viu a imagem de uma linda mulher com olhos amarelados e corpo estrutural segurando Luke em seu colo como uma mãe acolhe a sua criança em dias de infortúnio.
"Mestre, eu vou cuidar de você." — sibilou Wiki de forma suave, demonstrando todo o seu afeto pelo humano mais importante em sua vida.
Wiki fez um aceno para que Lukas a seguisse para longe dali. O garoto foi guiado para fora do salão e aos poucos tudo ao seu redor começava a desmoronar. A Porygon-Z contornava a sala com pressa procurando por uma saída. A sirene soava. Lukas voltou-se para os Pokémons ali presentes e perguntou:
— Como sairemos daqui?! — indagou Lukas.
Wiki fixou sua atenção em uma parede específica, e deu sinal para que todos se afastassem o mais depressa possível. A muralha de concreto explodiu em milhões de partículas quando um enorme Metang surgiu como um tanque de guerra para o resgate de seu armamento. Luke não tinha consciência para ver seu Pokémon evoluído, mas certamente teria ficado orgulhoso. Não havia tempo para confraternizações e Wiki imediatamente indicou para que seus amigos segurassem firme no espectro metálico. Yoshiki e Jade apoiaram-se no corpo do Metang, Lukas estendeu o braço para que Luke estivesse seguro em cima de seu Pokémon, e assim que Wiki confirmou a segurança de todos, Vista partiu como um foguete pelo caminho que havia traçado até aquele local.
Seu corpo de metal era um trator desgovernado e destruidor. O Metang utilizava de seus braços como mísseis e o turbo de sua energia era convertido numa velocidade impressionante que permitiu a transição do Setor Zero em questão de poucos minutos.
"I drive, you shoot." — disse Vista.
Pokémons encontravam-se caídos por todos os lados, as paredes desabavam, a sirene soava e cada segundo que passava no relógio parecia a apreensão de todos aumentava. A cada metro que a equipe percorria uma nova figura aparecia em seu caminho, mas não havia tempo para lidar com meros clones e Vista atropelava todos abrindo um caminho em meio à última destruição. O destino deles era o saguão central, o local onde eles se encontraram pela primeira vez, e agora, seria seu ponto de reencontro para que eles finalmente dessem adeus àquele inferno criado pela raça humana.
Quando eles finalmente chegaram a velocidade de Vista foi diminuindo e a máquina parou permitindo a saída de seus mestres. Os primeiros vistos no salão foram os Pokémons de Dawn, tal como a companhia de Mothim. Luke ainda estava desacordado, e por isso era carregado nas costas do grande Lairon. Lukas olhou ao redor e mal pôde reconhecer o ambiente, era lá onde eles haviam começado aquela terrível batalha, e seria ali onde a despedida da ilha de ferro seria concluída. Um a um seus companheiros chegavam dos portões dos demais setores. O primeiro a aparecer foi Bastiodon, carregando o debilitado General Dusclops em suas costas enquanto Froslass e Eevee davam apoio. O moreno abriu os braços para abraçar sua pequena raposa, mas arregalou os olhos ao notar que uma inundação cobria todo o Setor 2 e seus Pokémons fugiam da água que consumia tudo ao seu redor.
— Tudo isso estará debaixo d'água em poucos minutos, devemos sair daqui!! — alertou Lukas.
"Perdão, mon cher. Mas derrubamos dragões e demônios, e não será um pouquinho de água que nos impedirá de continuar seguindo."
Lukas virou-se ao notar que sua Roserade de o Gastrodon obeso criavam uma barreira para que toda aquela água fosse contida. O garoto sorriu admirado pela força de seus próprios Pokémons ao ver a rosa mandar-lhe uma piscadela, mas Akebia imediatamente alertou que o telhado desmoronava e enormes pedras iam a encontro de seu mestre.
Foi nesse momento que Togetic e Gardevoir entraram em ação. Com seus movimentos psíquicos Sophie controlou a fúria da natureza criando um escudo cristalino em volta de toda a sua equipe. Karl manuseou seu Ancientpower, e por meio dele arremessou as pedras para longe impedindo que o perigo os afligisse.
"Oh, meu bebê está crescendo! Não precisa mais ficar escondido na barra da saia da mamãe!" — disse a Gardevoir.
"Qual é, Sophie. Vai acabar com a minha reputação na frente do meu Mestre?" — respondeu Karl com uma risada.
Lukas agradeceu toda sua equipe com um aceno, e a cada instante sentia que estava mais conectado aos Pokémons ao seu redor. Eles eram muito mais do que instrumentos de batalhas, eles eram parte de sua família, e a segurança dos demais era apenas uma de suas muitas obrigações como treinador. Ele olhou rapidamente para os lados e notou que os portões dos cinco setores eram cobertos por pedras e completamente estavam destruídos. Em meio a sua preocupação, gritou:
— Onde estão os outros?! O que aconteceu com os demais?
"Fique tranquilo, pois eles virão." — assentiu Chaud.
O teto onde eles estavam começou a ruir, o que obrigou-os a deixar aquele local o mais depressa possível. Saíram do salão onde Malbora e Magnum foram derrotados e deixaram para trás as vagas lembranças de uma terrível guerra contra a Grande Criação dos Rockets. Ao saírem da base viram que todo o mar estava bravio, o céu era pintado por um manto plúmbeo de cores sem vida, o chão tremia na medida que tudo ao seu redor parecia ser coberto pela ira da natureza em ser confrontada pela ação dos humanos.
Mesmo longe, a sirene ainda podia ser ouvida. As ondas batiam com força nas pedras da costa e as árvores encurvavam-se em direção do vento como se tivessem medo de serem castigadas. Lukas ainda virou-se para trás tendo a esperança de ver seus Pokémons remanescentes saírem dali com vida, mas não viu nada. Sua pequena Eevee apontou para o céu ao notar uma sombra que sobrevoava a todos com aptidão. Lukas esboçou um sorriso ao ver um Honchkrow pousar triunfalmente, e ao abrir suas asas o corvo negro tinha uma jovem Monferno sob sua proteção, no conforto dos braços de seu protetor absoluto.
Lukas soltou um suspiro de alívio ao vê-los bem.
— Scarface! Quando foi que você evoluiu? — perguntou ele surpreso, tendo imediatamente a resposta em sua mente — Foi por causa do tio Marshall?! Ele ainda está lá dentro, precisamos salvá-lo!!
Lukas foi surpreendido ao ouvir uma explosão de um dos setores, e por conseguinte a única entrada para a base estrava destruída por completo. O garoto não escondeu a feição pasma, por um momento toda a equipe juntou-se num círculo na medida que uma sombra avançava sobre eles, e do alto era possível notar que a montanha desmoronava sobre eles.
"Não podemos contê-la!! Corram o máximo que puder!!" — gritou General com enorme exatidão.
Uma parede imensa de rochas de pedregulhos despencava de pouco em pouco, e nem mesmo Pokémons seriam capazes de fazer frente a fúria da natureza. Mesmo ferido, o Dusclops indicou que todos corressem para longe o mais rápido possível, mas a terra desabava e a ilha de ferro era consumida pela fúria do oceano com ventos e uma reviravolta nunca antes vista no oceano. Subitamente, em meio aos gritos e a euforia, Luke despertou.
— Cuidado!! — gritou para o irmão.
Ao virar-se eles tiveram a impressão de seria impossível escapar daquela sina. A montanha já avançava sobre eles, e então, um gigantesco Rhyhorn surgiu e impediu que aquela parede ruísse e despencasse por cima de seus companheiros. Lukas virou-se e notou que Mikau e Milena estavam acompanhados daquele imenso Pokémon, e reunindo o poder de todos os demais os Irmãos Wallers indicaram em conjunto um golpe para a destruir a montanha. Os ataques de cada um se fundiram e impediram que a natureza avançasse, contendo sua raiva por alguns instantes. O gigante Rhyhorn segurava tudo com suas próprias mãos e com um punho do tamanho de um cometa destroçou-a dando mais uma oportunidade dos humanos de saírem dali com vida.
"Estou cansado, patrão. Muito cansado. Mas ainda não está na hora de desistir." — disse Coffey.
A sirene soou mais uma vez, seu barulho estridente já atormentava até mesmo audição dos mais pacientes, mas logo pareceu ser interrompida por algo. Subitamente ela parou, e ao olhar para o alto onde a sirene situava-se Lukas pôde ver um Garchomp com um pequeno Pachirisu em seu ombro. O dragão jogou a grande caixa de som destruída na frente de seus companheiros enquanto apoiava-se na pilastra ao lado.
“Fala sério, esse barulho já encheu o saco.” — riu Aerus, transmitindo claramente aquela impressão por sua risada.
"Entramos aqui unidos e de mãos dadas, sem a certeza de vitória. E agora, sairemos desta mesma linha com a união e a esperança entrelaçadas. — respondeu Watt.
Lukas sorriu de maneira incontida ao ver que Marshall e Dawn estavam logo ao lado dos principais guerreiros dos Irmãos Wallers, com o trabalho em equipe todos eles foram capazes de saírem daquele tortuoso labirinto com vida, e apesar das dificuldades parecerem já ter passado, o verdadeiro desafio estava apenas para começar. Os olhos de Dawn já se enchiam de lágrimas ao ver que Luke estava a salvo. A garota correu para abraçá-los enquanto gritava emocionada, nunca esteve tão feliz por vê-los juntos, principalmente ao fim de uma batalha que nenhum deles sabia como poderia terminar. Em meio ao caos que se expandiu ao seu redor a menina abraçou gentilmente os dois meninos enquanto agradecia a esperança por nunca tê-la abandonado.
— Mal posso acreditar que estamos juntos novamente. Nós três! Nós três!! — ela repetia com entusiasmo.
— Um pouco acabados, mas deu pra tudo terminar bem, já é um começo. — respondeu Luke com uma risada, logo sendo interrompido por Marshall.
— Mas este é apenas o começo do fim, jovem Luke. O Executivo Archer é um homem precavido e ativou a auto-destruição da ilha quando eu o enfrentei. E, segundo meus cálculos, ela pode vir a ser implodida dentro de treze minutos.
— Interessante, treze é o número da sorte do papai. — comentou Lukas com uma risada.
Em meio a toda a correria os Irmãos Wallers não tinham pensado na possibilidade de explosão, mas tudo agora fazia sentido. Eles mal tiveram tempo de retornarem os seus Pokémons para as pokébolas, e de fato não era permitido que eles caminhassem com mais de seis criaturas nos dispositivos, e por isso pediram o auxílio de todos mais uma vez, pois agora o trabalho deveria ser feito com grande velocidade a traça um objetivo específico: Evacuar a ilha. Eles correram para a costa onde os barcos estavam atracados, balançando conforme as ondas batiam de forma violenta em seus cascos. Um dos membros da equipe de Marshall já aguardava seu chefe com enorme ansiedade.
— Senhor Marshall, fomos capazes de desativar todas as bombas! Falta apenas uma!! — afirmou o policial.
Marshall olhou para o redor e não acreditou naquilo. Ele confiava em sua equipe, mas não se tratava da implosão de um simples grupo de criminosos, e sim, dos terroristas mais procurados de toda a Sinnoh.
— Onde está o jovem Roark e o senhor Byron?
— Eles estão desativando a última, confiamos o nosso trabalho aos dois maiores especialistas em solo da região. Eles sabem o que fazem.
E certamente, Roark estava muito concentrado em seus afazeres. Seu rosto já estava sujo de poeira e até mesmo um pouco machucado por choques que levara das faíscas de bombas anteriores. O rapaz chegou inclusive a tirar o capacete, o que era um ato raro para ele. Ajeitou os óculos enquanto concentrava-se minuciosamente na desativação de um explosivo. Seu pai o observava apreensivo, e num rápido corte o garoto cortou e desativou a última bomba da ilha.
— Consegui!! — afirmou Roark animado.
Mas a sirene continuava soando com insistência. A bomba continuava desativada em sua mão, ele tinha a absoluta certeza de que não havia nenhuma outra escondida superficialmente na ilha, a menos que...
— Não pode ser... — balbuciou Byron indignado.
— A ilha é uma bomba, — respondeu Roark com certeza do que dizia — e é impossível desativá-la.
Os dois líderes juntaram seus pertences e imediatamente deram a notícia para Marshall. O Ex-Elite ficou apreensivo, pois sabia que mesmo partindo imediatamente eles não poderiam impedir um desastre, e para piorar a situação, o impacto da explosão poderia atingir de Canalave até Eterna, duas das cidades mais populosas de Sinnoh, e seus resquícios poderiam ameaçar até mesmo Jubilife, a maior metrópole da região.
Marshall não deu tréguas e imediatamente ordenou que sua equipe se preparasse para partir. Os Pokémons dos Irmãos Wallers ajudavam no que podiam, seus aquáticos utilizavam de seus poderes para preparar as embarcações e confrontar o oceano. Até mesmo os jovens se ofereciam para prestar auxílio naquela situação de tanta euforia. Luke esticou a mão para Dawn, e a menina apoiou-se nele para subir no barco, quando o jovem preparava-se para partir novamente ela o puxou e encarou seus olhos cansados e mal dormidos com enorme paixão.
— Tome cuidado, eu não quero perder você de novo. — disse Dawn.
Luke assentiu com um aceno, mas não lhe deu resposta. Realmente desejou retribuir aquele gesto com carinho e devoção, mas nenhuma palavra saiu de sua boca. Soltou um longo suspiro temendo que aquela batalha chegasse mais longe do que eles pudessem imaginar. Teve medo de que pudesse perder a garota com seus atos estúpidos e infantis, que ela o abandonaria na primeira oportunidade, mas agora ela estava lá, todos estavam. Seus amigos haviam enfrentado os próprios medos para o resgate do jovem, e aquele era o sentimento mais importante a ser lembrado.
Marshall também foi em direção de Lukas e segurou no ombro do pequeno ao dizer com sua voz grossa:
— Teremos uma conversa muito séria quando tudo isso terminar. — disse o tio com certa seriedade.
Lukas engoliu seco, mas em seguida Marshall estendeu uma corda em direção do jovem e esboçou um sorriso confortante.
— Eu teria de promovê-lo se você trabalhasse na polícia. Por sorte tenho um sobrinho tão bom quanto qualquer outro policial da região.
Todos os preparativos foram feitos com imensa velocidade, os peritos da polícia de Sinnoh também tinham seus próprios Pokémons, e com o auxílio de Mikau e Milena liderando as demais criaturas eles logo se preparavam para zarpar da ilha. Luke voltou-se para trás ao notar que aquele gigantesco Rhyhorn não caberia no barco por conta de seu peso. Mikau o observou com atenção e em seguida chamou seu treinador.
— Onde você encontrou esse grandão, Mikau? — indagou Luke.
“É o meu presente para o senhor, um prisioneiro de batalha, e um desejo de boas vindas ao retorno do rei.” — assentiu o Seadra num gesto honroso.
Luke sorriu e encarou o imenso Rhyhorn com convicção, mais tarde ele faria as devidas apresentações, mas aceitou o presente com enorme ânimo. Recebeu uma Great Ball de seu irmão, e assim o capturou, para em seguida ouvir a voz de Dawn aflita de dentro do barco:
— Depressa!! Não temos tempo!
— Já estou indo! Qual é, vocês vão me deixar para trás depois de tudo?
Luke deu um pulo no barco tropeçando em uma banqueta de madeira, mas no mesmo instante sentiu que alguém o segurava, e assim que ergueu seus olhos pôde ver seu irmão encará-lo com grande entusiasmo.
— Temos que sair daqui com você inteiro, qual teria sido nosso objetivo se você fosse deixado para trás? Entenda que eu jamais partiria sem você.
— Eu faria o mesmo, irmão. Eu faria o mesmo.
Na medida que o sol tomava espaço no horizonte alaranjado do amanhecer a sirene soava com maior insistência e em um tom muito mais aterrorizante. Roark se condenava por não ter conseguido desativar todas as bombas há tempo e temia que tudo tivesse sido em vão, mas, de repente, eles puderam ver um barco chegando ao longe, e nele o símbolo do Governo de Sinnoh estampado na proa. Marshall tomou frente no barco e foi verificar de quem se tratava. Ele imediatamente teria ordenado que recuassem, mas ao ver o homem que guiava o barco surpreendeu-se ao citar apenas seu nome.
— Ike Smithsonian. — disse Marshall.
Ike encostou sua lancha o mais próximo possível da costa, e ao ver Marshall e sua equipe junto dos Irmãos Wallers não precisou de nenhuma explicação para entender o que estava acontecendo naquele ambiente hostil e selvagem da Ilha de Ferro. Ike fez um gesto calmo e paciente, sendo cortês e educado demonstrando ter claro controle da situação;
— Afastem-se da ilha o quanto for possível. Deixem que o resto eu resolvo.
Marshall sabia como dar ordens, mas todos os seus anos ao lado de Walter também lhe deram o bom senso de saber quando cumpri-las. Luke e Lukas viram o homem metálico da Elite, porém, mal tiveram tempo de cumprimentá-lo ou impedi-lo de qualquer ato quando o barco zarpou deixando todo aquele pesadelo para trás. Dawn gritou em meio a sua euforia:
— Mas nós vamos deixar o Senhor Ike sozinho naquele lugar?!
— Ele sabe o que faz, senhorita Manson.
Marshall viu ali não apenas um dos homens mais influentes da região na atualidade, e sim, o aprendiz de Selena, o marido da Mulher de Ferro, sua melhor amiga. Nada era capaz de derrubar aquela moça quando ela teimava a persistir em algo, e não seria uma simples explosão capaz de destruir a fortaleza que ela própria construíra. Ike cantarolava uma singela melodia na medida que saía de sua embarcação para aquele cenário desesperador. Sua voz era o único conforto naquele ambiente e soava desaparecendo ao vento por nunca ter sido ouvida por ninguém.
"Outro dia, outro amanhecer
Estou voltando para onde eu pertenço, e eu nunca me senti tão forte
Eu sinto que não há nada que eu não possa tentar
Se você já perdeu uma luz antes, esta é pra você
Os sonhos são para você
Estou voltando para casa"
O barco de Marshall zarpou como um torpedo pelo mar bravio, e guiados pela força de dois dos aquáticos mais poderosos do continente não demoraram em alcançar uma distância razoável. Ike tinha sua humilde embarcação na praia, e assim, retirou os sapatos envernizados de forma calma e retórica para sentir a maciez da areia molhada em seus pés. Ignorou completamente a sirene que soava cada vez mais forte, era claro que restavam poucos minutos para a explosão de tudo, mas ele não ligou.
Soltou um longo suspiro ao sentir as ondas em seus pés, o vento no rosto, e contemplar uma única vez seu investimento em uma das ilhas que outrora já fora a mais bela de Sinnoh. Há muitos anos ele não tirava férias da Liga, e comandar a Elite atrás apenas do campeão era um enorme fardo para qualquer um, mas ele apreciava. Aproveitou de seu curto tempo no local, mas Ike era um homem de negócios e sabia que seu investimento na Iron Island fora benéfico para que eles finalmente descobrissem e dessem um fim ao reinado de terror dos Rockets. O homem sacou uma pokébola do bolso e jogou-a para o alto.
— Bem, as férias terminaram. Está na hora de voltar ao trabalho.
A pokébola liberou um brilho colossal, e dela surgiu uma enorme serpente de metal. Um Steelix enrolou-se em volta de seu mestre e aguardou as ordens com convicção. Ike tocou levemente no rosto da criatura e deu-lhe uma única ordem:
— Titânia, destrua a ilha.
— Será um prazer.
A serpente rastejou até onde tinha uma distância razoável de seu dono. Naquela situação os olhos diziam que ela era apenas uma serpente de metal, mas ao coração de quem a observava ela tomava a forma de uma linda mulher de armadura prateada. Sua cintura era longa e remexia-se no ritmo de um rebolado sensual. Sua armadura era impenetrável, as roupas eram entrepostas e forjadas pelos maiores ferreiros da região, seu braçal tinha a eficiência de um escudo e as ombreiras eram mais resistentes do que o próprio diamante. Seus longos cabelos negros esvoaçavam ao vento enquanto ela preparava suas mãos como num ritual de um treino. Titânia fechou os olhos e esqueceu-se do barulho ao redor, do som das ondas, do toque do vento. Assim que abriu-os estufou o peito e jogou os braços para frente causando um impacto que o universo apenas sentiu nos primeiros dias de sua criação.
Earthquake.
E tudo foi consumido pelo mar. O fluxo do tempo pareceu inverter-se, as placas tectônicas foram destroçadas e nunca mais voltaram ao normal, uma enorme tromba d’água surgiu onde repousava aquela ilha alcançando até os céus e cortando as nuvens como uma torre sem fim. Os Irmãos Wallers encaravam tudo da embarcação, e o grande iate quase virou com a força das águas. O ambiente foi inteiramente dominada pelo terremoto, mas a serpente exercia total controle sobre seu poder e um círculo contornou exatamente onde a Ilha de Ferro situava-se sem afetar nada ao redor. Aerus estava pasmo por ver aquela cena, e mesmo de longe sabia que existia um único Pokémon capaz de controlar tal golpe com tamanha eficiência. O poder de Titânia lhe dava a força para criar e destruir continentes, ela havia se tornado o ícone de sua espécie e com toda certeza era uma das criaturas mais poderosas do Mundo Pokémon. Quando a tromba d'água dispersou-se aquela região já não era a mesma, a ilha havia desaparecido do mapa como se nunca tivesse existido.
E assim, veio a calmaria. Os policiais comemoraram, Marshall retirou o chapéu num sinal de respeito. Dawn tinha certeza de que ali existia uma ilha há poucos minutos. Luke e Lukas ainda olhavam para o lugar atentamente e desejavam de todo o coração que Ike não tivesse feito aquilo para salvá-los dando sua vida em troca. Um silêncio profundo reinou, e a sirene nunca mais foi ouvida. No oceano havia apenas um pilar de ferro e, no centro dele, um homem. Envolto no monumento reinava uma serpente, única dentre todos os guerreiros de sua espécie, e com a perspicácia de erguer-se como uma imperatriz. Por aquela cena eles podiam ter certeza do motivo de Ike ser reconhecido como o líder da atual Elite 4, de ser um dos homens mais poderosos daquela Era.
Um suspiro de gratificação e alívio foi incontido ao encarar tudo aquilo. Lukas olhou para o vazio ao seu redor e percebeu que nunca havia sonhado, que aquele pesadelo chegava ao fim, e como no melhor de seus sonhos ele comandou seus desejos até atingir o sucesso de suas ambições.
— Acabou. Finalmente, acabou.
— É, irmãozinho. Acho que agora, sim.